Por Claudionor Mendonça dos Santos
A democracia, no Brasil, vive momentos de aflição. É sabido que tal regime não consegue sobreviver por muito tempo, talvez em razão de que nossa República tenha como berço um golpe. A partir de então, a sociedade brasileira acostumou-se a tal situação, habituando-se aos frequentes atentados à Constituição e à nossa sofrida República.
A sociedade brasileira, leia-se a classe média, acredita que o câncer da corrupção nasceu a partir de meados do ano 2000 e arraigou-se somente num determinado partido político. Desinformada e manipulada, bate panelas diante do acervo corruptivo. Cala-se, criminosamente, diante da repressão e massacre de professores e estudantes. Chora por Paris, mas faz pouco caso de Mariana.
A fragilidade da democracia revela pontos débeis na manutenção da regra que assegura que todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido. Aponta-se que 70% dos nossos parlamentares foram eleitos com recursos oriundos do mundo empresarial que o Supremo Tribunal Federal achou por bem fazer cessar. Portanto, sabido que a sociedade brasileira não se constitui de tamanha porcentagem de empresários, é de se concluir que ela não se faz representar no Parlamento. Tal fato se deve, obviamente, ao alto custo das eleições, ultrapassando milhões de reais.
Diante desse quadro, urge que se concretize o mais rápido possível a reforma do nosso sistema eleitoral. Vivemos um sistema marcado pela absoluta discrepância entre o real e o legal. A desigualdade social diminuiu, mas ainda merece atenção, diante do triste quadro ainda visível nas esquinas das grandes cidades. A infância abandonada, o sistema penitenciário absolutamente falido, sendo que a população carcerária é a terceira do planeta, atrás somente dos Estados Unidos e China e já tendo ultrapassado a Rússia. A prostituição infantil se espalha pelas cidades nordestinas e, pior, com a condescendência dos próprios pais, tangidos pela miséria. A saúde pública atinge contornos cruéis, afetando principalmente os mais carentes.
À parte, o sistema educacional atinge contornos pungentes. Professores mal remunerados em escolas nas quais falta o mínimo de estrutura. Eles, os professores, fingem que ensinam e os alunos fingem que aprendem. E qualquer contestação é objeto de violenta repressão que recai tanto sobre os professores como sobre os alunos.
O genocídio da população jovem e negra da periferia pode ser considerado como verdadeira política de Estado. Mais de cinquenta mil pessoas são assassinadas anualmente, número superior ao montante de mortos em países em guerra.
É necessário resgatar o conceito de democracia. Tal sistema não pode abranger os absurdos por que passa a sociedade brasileira. Proteger nossas crianças, adolescentes, idosos e recuperar aqueles que cumprem pena nos sistemas prisionais, verdadeiras masmorras, implica, tudo, em reflexão.
E isso somente será superado quando a sociedade brasileira souber respeitar os direitos básicos contidos na Lei Maior e alguns de seus dispositivos deixarem de serem meros enunciados. Para tanto, os integrantes dos poderes constituídos deverão se despir de seu egoísmo e colocarem acima de tudo os interesses sociais. Fazer valer os fundamentos da República, especialmente a cidadania e a dignidade da pessoa humana, atingindo-se os objetivos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal, especialmente a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a erradicação da pobreza e redução da desigualdade social. Aí, sim, teremos efetivamente a verdadeira Democracia.
Claudionor Mendonça dos Santos é promotor de justiça e membro do Movimento Ministério Público Democrático.
FONTE: Correio da Cidadania
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