terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

PEC 186: Guedes prepara sua bomba atômica


País tem meios para retornar (e até ampliar) auxílio emergencial. Emissão de moeda é um caminho. Mas, sob o signo da “austeridade”, ministro lança projeto que exime Estado de oferecer serviços como Saúde e Educação. É preciso freá-lo

O ano era 2019, o primeiro do mandato de Bolsonaro. No entanto, as tragédias ocorridas em nosso País desde a sua posse foram tantas que tudo até parece muito mais longevo do que foi de fato. Paulo Guedes assumia sua condição de superministro da economia com toda a pompa e a arrogância que lhe são características. Sua primeira missão concluída com sucesso foi a aprovação da Reforma da Previdência. Se é verdade que o texto da votação definitiva em 23 de outubro estava bem distante da intenção destruidora total do Regime Geral da Previdência Social desejado pelo liberaloide, o fato é que as forças do financismo ficaram bem satisfeitas com o resultado obtido. Afinal, tratava-se ainda da primeira entrega do old chicago boy. Imaginava-se que as demais encomendas chegariam a pleno vapor.

Embalado pelos ventos aparentemente favoráveis e supostamente imbatíveis, o governo desembarca no Senado Federal alguns dias depois com todos os seus pesos pesados. Bolsonaro, Guedes e outros ministros vão ao gabinete da presidência entregar a Davi Alcolumbre um conjunto de três Propostas de Emenda Constitucional – as PECs 186, 187 e 188. O pacote ficou conhecido pelo enganoso nome de “Plano Mais Brasil”. Uma semana depois desse ato carregado de forte simbologia, a sensação de tratoragem seria ainda mais aumentada com a promulgação da Emenda Constitucional n°103, derivada da reforma previdenciária.

A trinca de propostas (Emergencial, Pacto Federativo e Fundos Públicos) era tão urgente que ficou parada desde então nas mãos do senador Márcio Bittar, nomeado à época como relator das mesmas. A história na sequência é conhecida por todos. O PIB de 2019 revela-se um fracasso retumbante, uma vez que a esperança toda depositada em Guedes se revela em um pibinho de minguados 1,1%, menos ainda que o já mirrado resultado obtido por Meirelles sob a gestão de Temer. A entrada em 2020 trouxe consigo a pandemia e as PECs continuaram adormecidas na gaveta do relator.

Os 3 Ds de Guedes: destruir, demolir e desmontar

Pois agora o governo resolve aproveitar aquele texto para retomar o processo que Paulo Guedes tanto enche a boca para descrever: os famosos 3 “D”s, ou seja, desobrigar, desvincular e desindexar. Na verdade, trata-se de mais uma tentativa de rasgar os dispositivos fundamentais da política de bem-estar ainda presentes na Constituição de 1988. Os 3 “D”s de fato almejados por ele, porém, são outros. Trata-se de destruir, demolir e desmontar.

A novidade do momento é a chantagem apresentada junto ao Congresso Nacional, na tentativa de ganhar apoio de parcelas da opinião pública. A versão atual da PEC 186 é identificada na forma do substitutivo apresentado pelo relator Bittar. A narrativa do momento pretende apresentar o conjunto de maldades como uma contrapartida necessária e inescapável do restabelecimento do Auxílio Emergencial. Mentira!

É de amplo conhecimento que Paulo Guedes é totalmente contrário à renovação do benefício, instrumento essencial para que a maioria da população sofra menos as agruras da recessão e do confinamento. Além disso, a volta do auxílio é fundamental para minorar os efeitos negativos em termos macroeconômicos, uma vez que ele permite a manutenção do poder de consumo para dezenas de milhões de famílias.

Há um ano atrás, ainda quando vivíamos o início da primeira onda da covid-19, o superministro havia convencido o chefe a oferecer uma única prestação de R$ 200. O Congresso Nacional impôs uma importante derrota ao governo e definiu o valor inicial de R$ 600 mensais. Ocorre que no momento da renovação do auxílio em setembro, Guedes reduziu o valor pela metade e ainda apontou a data de validade para 31 de dezembro. Os efeitos humanos, sociais e econômicos foram trágicos. A popularidade de Bolsonaro começou a cair em razão da inexistência de amparo do governo e por sua atitude genocida com relação à urgência da vacinação.

Aprovar o Auxílio não exige a maldade em troca

A pressão da sociedade tem aumentado e os congressistas sentem a necessidade de apresentar alguma resposta. Pois nessa hora Guedes saca a carta escondida debaixo da manga. Com o surrado discurso enganoso de “não temos recursos”, propõe o valor vergonhoso e criminoso de R$ 250 ao mês para volta do auxílio. Além disso, impõe uma série de condicionalidades em sua aplicação, de maneira a reduzir o acesso da população à medida e, assim, reduzir o sacrossanto impacto orçamentário do mesmo.

Porém o mais grave são as condições da “negociação” que pretende impor ao legislativo na apreciação desta versão turbinada da PEC 186. Para além das medidas de redução compulsória dos salários dos servidores públicos, Guedes introduz agora as propostas de seus sonhos. Ele pretende retirar as obrigatoriedades previstas no texto constitucional para assegurar minimamente os serviços básicos do Estado nas áreas essenciais e estratégicas da educação e da saúde, entre outras. Uma loucura!

Em troca de uma retomada do auxílio emergencial por alguns meses em um valor ridículo frente as reais necessidades de sobrevivência da maioria da população, Guedes pretende deixar armada uma bomba atômica para destruir a capacidade dos governos oferecerem à população esses serviços públicos fundamentais. Ocorre que não há justificativa para que essa demolição seja colocada como pré-condição para que o auxílio seja restabelecido. O governo tem todas as condições para criar recursos no orçamento através de emissão de moeda ou aumento da dívida pública para realizar essa despesa extraordinária e essencial.

Revogar a PEC 186!

A maioria dos governos dos países do mundo capitalista reorientaram suas políticas econômicas a partir do advento da pandemia. A busca burra e cega pela austeridade a qualquer custo foi substituída pela necessidade evidente de oferecer medidas contracíclicas para superar a crise sanitária e minorar os efeitos da recessão que atinge a todos. Em momentos como o que vivemos atualmente, a exemplo do que também ocorreu a partir da grande crise de 2008/9, a função do Estado é assumir o protagonismo na recuperação das atividades e aumentar suas despesas. No entanto, Paulo Guedes segue com seu negacionismo de tais evidências do mundo real e impõe um custo fenomenal à maioria da população e ao futuro do Brasil.

Ser quisermos manter alguma esperança na capacidade de superar a crise atual e preservarmos algum espaço para a retomada de um projeto de desenvolvimento social e econômico de inclusão e sustentabilidade, então é fundamental barrar a aprovação da PEC 186. Os senadores deveriam prestar atenção ao placar da consulta virtual realizada pela Casa, onde 97% dos internautas já se manifestaram contrariamente à medida. As verdadeiras travas à possibilidade da concessão do auxílio emergencial podem ser retiradas por meio da necessária revogação da EC 95, aquela mesma que congela as despesas governamentais por 20 anos, até o longínquo exercício de 2036.


PAULO KLIASS

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Sobre racismo estrutural no Brasil




ALEXANDRE MAGALHÃES – Nas últimas semanas estamos acompanhando a repercussão mundial da onda de protestos em diferentes cidades dos EUA em decorrência do caso George Floyd, um homem negro asfixiado até a morte por um policial branco de Minneapolis enquanto seus colegas assistiam à cena macabra sem nada fazerem. Enquanto era morto, Floyd repetia uma frase que vem ecoando nos protestos e mundo afora: “não consigo respirar”.

No Rio de Janeiro, no dia 18 de maio, o adolescente João Pedro Mattos Pinto, de apenas 14 anos, foi morto dentro de casa durante uma operação conjunta realizada pelas polícias Federal e Civil na região do Complexo do Salgueiro, na cidade de São Gonçalo, região metropolitana do estado.

No último dia 2 de junho, na cidade de Recife (Pernambuco), Miguel Otávio Santana da Silva, de apenas cinco anos, caiu do nono andar do prédio onde a sua mãe trabalhava e morreu momentos depois. Nesse instante, sua mãe estava passeando na rua com o cachorro da patroa, que supostamente teria ficado responsável pelos cuidados da criança.

No cenário da pandemia, os últimos dados têm demonstrado não somente que o novo coronavírus vem se espalhado por favelas, periferias e interiores, mas atingido principalmente a população negra. Hoje, no Brasil, a proporção de mortos entre pessoas negras é maior do que entre as brancas.

O que todos esses fatos têm em comum? Qual a linha que os conecta de alguma forma? O que eles dizem sobre nós, enquanto sociedade?

Historicamente, é possível afirmar que as pessoas negras são os alvos preferenciais das polícias, assim como são as que se encontram mais expostas a infecções e contaminações de todos os tipos. São também a maioria entre os desempregados, subempregados e no trabalho informal.

As denúncias e notícias relacionadas tanto aos casos de violência policial quanto aos cuidados que dizem respeito aos impactos do novo coronavírus, bem como a morte do menino Otávio nos revelam algo acerca do racismo estrutural, institucionalizado e culturalmente enraizado que organiza as relações sociais no Brasil.

Revelam também como a escravidão ressoa ainda hoje em múltiplos domínios, desde relações interpessoais até medidas governamentais mais amplas (como aquelas relacionadas à ação da polícia e de combate à pandemia). O racismo estrutural e institucionalizado regula práticas, estabelece relações, conforma subjetividades e produz as condições de vida e morte de uns e outros.

No caso da violência policial, considerando os dados oficiais do primeiro semestre de 2019 no estado do Rio de Janeiro, 80% dos mortos pela polícia eram negros, em sua maioria homens, jovens e moradores de favelas. Em pesquisa realizada na PUC-Rio, segundo os dados oficiais consultados, chegou-se à conclusão de que pessoas negras de baixa escolaridade morrem quatro vezes mais pela covid-19 do que pessoas brancas com ensino superior. Mesmo quando se leva em consideração a mesma escolaridade, negros e negras apresentam uma proporção de mortes 37% maior em relação aos brancos. Atualmente, em plena subida da curva de contágio, pessoas negras correspondem a 57% dos mortos pelo novo coronavirus enquanto os brancos 41% (segundo dados do Ministério da Saúde).

O racismo estrutural e institucionalizado regula práticas, estabelece relações, conforma subjetividades e produz as condições de vida e morte de uns e outros

Estamos aqui lidando com uma exposição contínua dos corpos negros à morte. De um lado, no caso da ação policial, para que a maquinaria de guerra funcione (com a justificativa da chamada “guerra às drogas”) é fundamental a construção de uma alteridade radical, territorializada e racializada. No cenário das grandes cidades brasileiras, esse Outro da cidade, a imagem do medo, localiza-se no corpo favelado (em sua maioria negro). Um corpo que precisa ser supliciado e, no limite, exterminado para que uma determinada ordem (violenta e desigual) se reproduza.

De outro lado, é visível que os impactos do novo coronavírus não são os mesmos em todos os lugares e para todas as pessoas. Diferenças de geração, classe, gênero, raça e lugar de moradia demarcam as possibilidades de cuidado e de acesso aos serviços médico-hospitalares (e também assistenciais), já que tanto aquelas possibilidades quanto o acesso a estes serviços são distribuídos desigualmente tendo em vista recortes raciais e de classe.

É notório também, de acordo com inúmeros levantamentos, que a população negra é aquela que habita áreas com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), com maior número de pessoas morando em um mesmo domicílio, onde o saneamento básico é precário e o acesso a serviços de saúde limitado.

Em relação a estes últimos, segundo pesquisa do Ipea, 67% das pessoas negras dependem do Sistema Único de Saúde, o mesmo sistema que vem sofrendo com desfinanciamento e sucateamento cada vez mais acelerados nos últimos tempos. Ou seja, o desfinaciamento e o sucateamento atingem diretamente a população negra e por isso podem ser considerados uma das manifestações institucionais do racismo estrutural e da violência estatal direcionada a esta população. Além disso, essa população é a que mais sofre com o desemprego, especialmente as mulheres negras, nesse momento da pandemia.

Reconstruir muito brevemente o cenário de vida da população negra no Brasil nos aponta para a consideração de uma experiência que se dá no limite da existência, de uma vida constantemente exposta, vulnerável, asfixiada e sufocada

Diante de um cenário como esse, como garantir que pessoas negras, em geral moradoras de favelas e periferias, fiquem em casa quando para boa parte delas a possibilidade de obtenção da renda que sustenta suas famílias depende da circulação pela cidade? Elas representam uma multidão de trabalhadoras domésticas, informais, camelôs que precisam se movimentar para conseguir o pão de cada dia.

Quando observamos os casos de violência policial, a incidência da Covid-19 entre as pessoas negras e o trabalho precarizado em meio à pandemia podemos ter uma ideia de como operam os mecanismos de precarização e de exposição das vidas negras em uma sociedade extremamente desigual, hierárquica, racista e violenta. Enquanto alguns conseguem se cuidar e evitar o contágio, outros precisam sair de suas casas na periferia, levar seus filhos (que não têm onde ficar) para trabalhar nas áreas nobres. E correr o risco de ver o seu filho, por negligência, morrer ao cair do 9° de um prédio de luxo. Ou se sentir a salvo do avanço do coronavírus dentro de casa numa comunidade, mas não das balas das armas dos fuzis das polícias.

Essa configuração nos traz novamente para a frase símbolo dos protestos nos EUA: “não consigo respirar”. Reconstruir muito brevemente o cenário de vida da população negra no Brasil nos aponta para a consideração de uma experiência que se dá no limite da existência, de uma vida constantemente exposta, vulnerável, asfixiada e sufocada. Sufocada literalmente nas mãos da polícia, mas também em função das precárias condições de moradia, de acesso à trabalho, à saúde, assistência social e também pelo não reconhecimento de sua humanidade. Tratados como quase humanas ou simplesmente como não humanas (em geral são animalizados, o que historicamente justifica a ação violenta por parte do Estado), as pessoas negras insistem em (r)existir (existir, reexistir, resistir), tomando um último fôlego e gritando: vidas negras importam!

Fonte da matéria: https://cee.fiocruz.br/?q=Sobre-racismo-estrutural-no-Brasil

FONTE: Controvérsia


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Enem na pandemia retrata e impulsiona desigualdades

  

Por Luiza Dulci


As condições de realização da prova foram altamente excludentes. Em razão disso, vimos a maior taxa de abstenção da história do Enem, 51,5%

 


No domingo 17 de janeiro de 2021, foi realizada a primeira etapa do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020, envolvendo as áreas de linguagens, ciências humanas e redação – esta com o tema "o estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira". A segunda etapa ocorre uma semana depois, com questões sobre ciências da natureza e matemática.

A realização de uma prova nacional em um país das dimensões do Brasil não é uma operação simples. Embora tenha sido criado em 1998 para fins de avaliação do Ensino Médio, a primeira grande ampliação do Enem veio em 2004, quando passou a ser critério para as bolsas do Programa Universidade para Todos (ProUni).

A partir de 2009, com a criação do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), tornou-se base para a admissão de estudantes em quase todas as universidades públicas e privadas brasileiras. De lá para cá, foram muitas as polêmicas envolvendo as provas, com destaque para aspectos socioeconômicos, históricos e políticos abordados nas questões, o formato não conteudista e mais interdisciplinar da prova, bem como a escolha dos temas da redação.

Em 2009, um problema de vazamento das provas pela gráfica provocou questionamentos sobre a logística de aplicação do Enem, mas o governo enfrentou a questão com seriedade e transparência, garantindo que nenhum estudante fosse prejudicado e mantendo, assim, a confiança da comunidade acadêmica em relação ao Enem.

Em 2019, no primeiro Enem da gestão Bolsonaro, a postura já foi outra. O então ministro da educação, Abraham Weintraub, tratou como "inconsistências" as falhas que prejudicaram mais de 6 mil candidatos. Em 2020 somaram-se problemas de ordem distinta. O ano foi atípico em todos os sentidos imagináveis – e não imagináveis. Como previsto, a realidade mostrou-se muito diferente do que havia dito Weintraub em abril: "o Enem é uma competição e ficou mais difícil pra todo mundo".

A interrupção das aulas presenciais logo no primeiro trimestre de 2020 impôs sérias restrições ao cumprimento do calendário acadêmico, acarretou dificuldades de concentração e foco para discentes, sobrecarga de trabalho para docentes, desafios didáticos para toda a comunidade escolar e agravou sobremaneira as desigualdades entre estudantes ricos e pobres. Segurança alimentar, acesso à internet e dispositivos de conexão, situação do ambiente domiciliar, condições de acompanhamento familiar e disponibilidade de tempo e materiais de apoio são alguns dos marcadores que permeiam as realidades desiguais dos estudantes brasileiros. Enquanto alguns precisaram trabalhar para ajudar na renda das famílias, outros seguiram acompanhando as aulas e tiveram reforço escolar com professores particulares.

O edital do Enem foi lançado em abril de 2020, quando a pandemia já estava instaurada no Brasil e no mundo. Desde então, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), a União Nacional dos Estudantes (UNE) e outras entidades vinham lutando pelo adiamento do exame em mobilizações reiteradamente ignoradas pelo governo federal, conforme registra a linha do tempo das ações da UBES por um Enem justo e seguro.

Se é fato que o adiamento conquistado em novembro de 2020 se deu em função da luta dos estudantes, sua realização em janeiro de 2021 não atenuou nenhuma das questões que já estavam em debate.

O abismo que separa estudantes em termos de classe, raça, local de moradia (centros e periferias urbanas e rurais) e a falta de diálogo com o governo evidenciaram que as condições de realização da prova foram de fato altamente excludentes. Em razão disso, vimos a maior taxa de abstenção da história do Enem, 51,5%, muito acima da maior taxa até então, de 37,7%, de 2009.

O caso do Amazonas é emblemático, mas muitas outras localidades do país passam por situações semelhantes. Outros treze estados vivem tendência de alta de casos da Covid-19. O governo prometeu protocolos de biossegurança para tentar dirimir os riscos de contaminação, considerando as aglomerações, o deslocamento até os locais de prova e a permanência em local fechado por 5 horas. Porém, foram muitas as falhas. A prova foi adiada em 58 municípios – 56 no Amazonas e 2 em Rondônia. Mais de 10 mil estudantes deixaram de comparecer por apresentar sintomas da Covid, dos quais 8.180 foram autorizados a realizar a prova em fevereiro, ao passo que 1.991 pedidos foram negados. Veremos quantos mais ficarão de fora da segunda etapa da prova, parte dos quais em razão de eventual contaminação na primeira etapa.

A alta abstenção foi também seletiva, afinal, quais as condições de comparecimento de estudantes pertencentes ao grupo de risco sanitário? Quais as implicações para os moradores de seus domicílios? Por isso vimos menos negras e negros, por isso vimos menos pessoas mais velhas no último dia 17. Enquanto esses não compareceram ou enfrentaram mil e uma dificuldades para estar presentes, barracas de apoio de cursinhos e escolas particulares foram montadas próximo a locais de prova. É evidente que, nessas condições, o Enem não vai criar oportunidades, ao contrário, reproduz e agrava as desigualdades educacionais no Brasil.

Sua realização foi mais um episódio de negação da pandemia. É notável que na semana em que a Anvisa valida a CoronaVac produzida pelo Instituto Butantan milhares de futuros cientistas e pesquisadores sejam tratados dessa forma. Suas vidas estão em risco. A ciência brasileira está em risco. O desenvolvimento nacional está em risco. Não dá mais.

 

Luiza Dulci é militante da JPT, integra o Conselho Curador da Fundação Perseu Abramo. É economista (UFMG), mestre em Sociologia (UFRJ) e doutoranda em Ciências Sociais, Desenvolvimento e Agricultura (UFRRJ)


 FONTE: Teoria e Debate

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