Por Jorge Antunes *
Um fenômeno interessante tem sido verificado em várias partes do mundo político. Jovens lideranças abandonam partidos e agrupamentos políticos tradicionais em que militavam, para criarem seus próprios partidos.
Em Portugal está se formando o “Iniciativa Liberal”. Na Espanha surgiu o “Podemos”. Na França foram criados o “Em Marcha” e o “França Insubmissa”. Na África do Sul a novidade é o “Lutadores da Liberdade Econômica”. Na Alemanha foi criado um novo partido nazista: o “Die Rechte”, liderado pelo neofascista Christian Worch. Na Colômbia surge o “Força Alternativa Revolucionária do Comum”(FARC). Na Argentina a ex-presidenta Cristina Kirchner organiza a criação de novo partido: o “Unidade Cidadã”. O “Movimento Cinco Estrelas”, criado em 2009, na Itália, pelo humorista Beppe Grillo, já elegeu quatro prefeitos e conquistou 26% das cadeiras na câmara dos deputados e 24% das cadeiras no senado.
No Brasil, é a direita que tem se destacado, criando partidos novos. Um deles é o “Novo”. Seu fundador é o engenheiro João Dionísio Amoêdo que defende as teses da direita, incluindo o liberalismo econômico. O TSE deferiu o registro do partido em 2015. O “Novo” defende o fim das cotas nas universidades e a flexibilização para o porte de armas.
Outro partido novo, também de direita, deverá já estar deferido pelo TSE em outubro: o “Partido da Igualdade”. Liderado pelo goiano Claudio Martins de Lisboa, esse partido combate a legalização do aborto e as drogas.
Mais de 50 outros partidos estão em formação, aguardando julgamento do TSE. Alguns deles: Partido Liberal (PL), Partido Muda Brasil (PMB), Nova Ordem Social (NOS) e Unidade Popular pelo Socialismo.
O desgaste dos partidos políticos está dando lugar à esperteza das velhas raposas, para ludibriar o eleitorado com a mera e simples mudança de nomes das agremiações. O PTdoB mudou o nome para “Avante”, o PTN agora se chama “Podemos”, o PSDC virou “Democracia Cristã” e o PMDB, agora, é MDB.
Podemos
Em 2014 foi criado, na Espanha, um novo partido de esquerda: o “Podemos”. Sua origem foi um manifesto, intitulado “Mover ficha: convertir la indignación en cambio político”, que foi publicado nas redes sociais num final de semana de janeiro de 2014. O manifesto trazia cerca de 30 signatários, entre os quais estavam personalidades da área cultural, escritores, filósofos e professores universitários.
O manifesto clamava a necessidade de se construir uma candidatura que concorresse às eleições europeias de maio de 2014, para se opor às políticas da União Europeia voltadas à crise econômica. O novo partido conquistou rapidamente milhares de seguidores e apoiadores. Foi indicado, como candidato, o analista político Pablo Iglesias, professor da Universidade Complutense de Madrid.
A participação do novo partido nas eleições europeias de 2014 teve sucesso, com a obtenção de cinco cadeiras, com 8% dos votos. Em poucos dias o Podemos superou os partidos tradicionais tais como o PSOE de centro-esquerda e o PP de direita.
Em Marcha
Em 2012 o presidente socialista da França, François Hollande, nomeou o jovem banqueiro Emmanuel Macron como secretário-adjunto da Presidência da República. Em 2014 Macron passou a ser Ministro da Economia. Em 2016 ele saiu do governo, para fundar seu próprio partido, o “La République en Marche” e lançou-se candidato à Presidência.
Na sua campanha de candidato, Emmanuel Macron logo conquistou enorme número de apoiadores e formulou os princípios que o norteariam: probidade, paridade, renovação, pluralismo político, coerência e mais mulheres na política. Macron foi eleito e é, hoje, o presidente da França. O En Marche se revela um partido de centro, social-liberal, que adota o liberalismo econômico e social.
A França Insubmissa
Em 2016, também na França, Jean-Luc Mélenchon fundou um novo partido de esquerda: La France Insoumise (França Insubmissa). A pretensão de Mélenchon era ser eleito presidente da República em 2017. O novo partido não conseguiu fazer acordo com o Partido Comunista Francês e, assim, não houve aliança.
O partido La France Insoumise se reivindica socialista, comunista, ecossocialista, marxista, anticapitalista e defende um populismo e um nacionalismo de esquerda.
Atualmente o partido conta com 17 deputados na Assembleia Nacional e um deputado no Parlamento Europeu.
Lutadores da Liberdade Econômica
Em julho de 2013 o líder sul-africano Julius Malema, então com 31 anos de idade, foi expulso da Liga da Juventude do Congresso Nacional Africano, agremiação da qual tinha sido presidente. Logo em seguida, Malema criou um novo partido: o Economic Freedom Fighters (Lutadores da Liberdade Econômica). Atualmente o EFF é o terceiro maior partido da África do Sul. Em 2014 o partido de Malema recebeu mais de um milhão de votos.
Malema e seu partido têm ideologia comunista, pan-africana, marxista-leninista, anti-imperialista e anticapitalista. Sua plataforma é bastante arrojada, defendendo a expropriação de terras da África do Sul sem indenização, a nacionalização de minas e bancos, desenvolvimento industrial, educação, saúde e moradia de qualidade e gratuita. Em uma de suas manifestações recentes, Julius Malema disse que 2018 vai ficar na história como o ano em que os negros voltaram à política.
Recentemente o presidente da África do Sul, Jacob Zuma, acusado de corrupção, renunciou. Em seu lugar assumiu o vice Cyril Ramaphosa, eleito pelo Parlamento. Mas sua eleição não agradou a Julius Malema e a seu partido Lutadores da Liberdade Econômica. A bancada abandonou o Parlamento, acusando a eleição de ilegítima, defendendo a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições. Novas eleições presidenciais serão realizadas em 2019.
Psol
Pelos relatos acima, em que resumimos a história de novos partidos surgidos neste início do século XXI, observamos a coincidência do fenômeno: um jovem político resolve criar um partido novo “para chamar de seu”, e se dá bem. Tudo dá certo, o partido cresce e ganha o poder das massas.
No Brasil aconteceu algo parecido, agora, com pequena diferença. O Psol convidou um jovem político, não filiado ao partido, para ser candidato à presidência da República, e o jovem político aceitou. O Psol ofereceu, ao jovem político recém-filiado, um partido “para chamar de dele”.
Isso vai dar certo? Sim, claro, vai dar certo provisoriamente. Juntaram-se a fome e a vontade de comer. Nenhuma das figuras públicas do partido queria se desgastar, aceitando a missão inglória de se candidatar à presidência da República, sabendo antecipadamente da derrota. Colocar um dos atuais vereadores ou deputados do partido nessa aventura, seria condená-lo à não reeleição para o mandato de parlamentar. Essa justificativa fica escondida nas recônditas conjecturas, porque outra maior justificativa se apresenta: o partido precisa manter ou aumentar sua bancada, para não ser penalizado pela “cláusula de barreira”. Pouco importa, no momento, se a base do Psol se divide. Vale o sacrifício. Logo logo tudo se ajeita. Alguns militantes gritam, esperneiam, abandonam o partido, mas em poucos meses tudo se recompõe.
Da parte do jovem político, tudo é também satisfatório. Com os dois ou três por cento que ele receberá nas urnas, em outubro deste ano, ele se cacifará para seguir os passos de Macron, Malema, Iglesias e Mélenchon. Tomo a liberdade futuróloga para vaticinar: em 2020 ou 2021 ele abandonará o Psol, para fundar um partido novo “para chamar de seu”. Esse partido novo poderá receber o nome de “Vamos”. Ou, então, poderá também receber um nome mais contestador, como, por exemplo, “Movimento dos Trabalhadores Sem Teto”. Mas, para isso, será preciso que a desgraça brasileira continue a existir por mais dois ou três anos, e que todos os sem-teto continuem sem-teto por mais tempo, e que cresça ainda mais a quantidade de sem-teto. Caso contrário o novo partido não terá seguidores.
* Jorge Antunes é Doutor em Esthetique Musicale – Universite de Paris 8; é presidente da Sociedade Brasileira de Música Eletroacustica; professor titular aposentado da Universidade de Brasília; Pesquisador Colaborador Sênior da Universidade de Brasília e Membro da Academia Brasileira de Música.
FONTE: Espaço Acadêmico
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