quinta-feira, 23 de maio de 2013

Prisão recuperadora, sonho impossível?


Ignoradas  pela mídia há quatro décadas, APACs espalham-se
pelo país e derrubam índices de reincidência no crime, ao
lembrar que objetivo principal da cadeia não é castigar

Por Jomar Morais


Uma frase de seu fundador, o advogado Mario Ottoboni, espelha a crença básica em que se apoia a prática revolucionária da APAC: “Todo homem é maior que o seu erro”.

A APAC – Associação de Proteção e Assistência ao Condenado —  é uma experiência iniciada nos anos 70 em São José dos Campos (SP) e, devido ao sucesso do projeto, hoje presente em 11 Estados brasileiros e até fora do país.

Não há como construir um sistema prisional decente e eficaz sem concordar com o princípio que inspira a entidade.  Nem sequer é possível um delinquente salvar a si mesmo sem essa crença fundamental.

Talvez, por isso, a frase de Ottoboni, escrita na parede com letras gigantes, é a primeira das muitas exortações a motivar reeducandos (prisioneiros) e administradores no Centro de Reintegração Social (prisão) da APAC em Macau, no Rio Grande do Norte.

Reeducandos? Centro de Reintegração? Neste caso não se trata de mero jogo de palavras, um recurso de marketing. Mais de vinte anos de experiência confirmam que, por trás dos rótulos politicamente corretos, opera um paradigma humanista de diferenciais marcantes e bem-sucedidos no trato da ferida social da criminalidade.  Aceitar, defender e cuidar da dignidade da vida é o fermento da receita.

A crença básica da APAC é o que falta ao falido sistema penitenciário oficial, espécie de geena dos tempos bíblicos para onde a sociedade tem enviado os seus novos “leprosos”, na ilusão de que a segregação pura e simples é vacina contra o mal.

Não é culpa da lei que, aperfeiçoada, aponta princípios e meios que garantem à pena as suas funções ressocializadoras  do indivíduo e retributiva da sociedade lesada. É fruto do desvio da melhor prática do direito e mesmo dos rudimentos da justiça, sob a ação de uma cadeia corruptora que permeia todos os segmentos do sistema prisional e vai além, muito além, de seus limites.

Para que essa roda de iniquidade continue a girar, é imperioso que se mantenha um ambiente de caos permanente e a total descrença na reeducação do homem.

Afinal, para justificar a queima do dinheiro do contribuinte em projetos faraônicos e inúteis nada melhor que estimular o medo diante de ameaças reais ou imaginárias.

Além disso, para que a roda da iniquidade rode, é necessário azeitá-la, continuamente, com a inclusão de mais colaboradores, dando à prática perversora a capilaridade necessária ao domínio de toda a estrutura.

Nesse contexto, a crença na recuperação do homem e o resgate de sua dignidade seriam obstáculos intransponíveis aos interesses inconfessáveis.

A experiência da APAC é uma alternativa concreta ao sistema oficial mergulhado no pântano.

Não é, certamente, a única possibilidade. Mas é a que está aí, referendada por números positivos e uma série de resultados só mensuráveis pelos corações que se beneficiaram direta e indiretamente de seu modelo.

Como explicar que, investindo apenas a quarta parte do que o Estado desperdiça com um apenado mantido em condições subumanas, a instituição obtenha resultados infinitamente melhores, conseguindo devolver à sociedade homens recuperados e não bandidos pós-graduados?

O índice de reincidência entre egressos do sistema oficial, em torno dos 90%, é a prova definitiva de sua falência.Na APAC, onde o prisioneiro cumpre uma rigorosa disciplina preservando sua dignidade, esse índice tem ficado abaixo dos 10%.

Como explicar que, sem policiais e agentes, sem usar armas e a brutalidade, os centros de reintegração da APAC não se tenham transformado em caldeirões de revolta, infernos de perversão e centrais de negócios ilícitos?

A questão central não é a da natureza da administração – se estatal ou privada. Um presídio privado pode oferecer conforto e não recuperar o criminoso. E pode ainda custar caro e assegurar a sobrevivência da teia corruptora.

O segredo do sucesso da APAC e da reeducação do delinquente está na crença fundamental sobre a essência do homem, seus valores e suas possibilidades, aplicada no dia a dia por administradores e reeducandos, com a colaboração das famílias e da sociedade, numa convivência respeitosa regida pelo amor e pela justiça.

 FONTE: Outras Palavras

terça-feira, 14 de maio de 2013

A melhor educação do mundo é 100% estatal, gratuita e universal


O documentário abaixo deveria ser assistido e discutido por todos os educadores, todas as escolas, todas as pessoas interessadas na educação no Brasil

Pragmatismo Politico

A Finlândia tem a melhor educação do mundo. Lá todas as crianças tem direito ao mesmo ensino, seja o filho do empresário ou o filho do garçom. Todas as escolas são públicas-estatais, eficientes, profissionalizadas. Todos os professores são servidores públicos, ganham bem e são estimulados e reconhecidos. Nas escolas há serviços de saúde e alimentação, tudo gratuito.

Na Finlândia a internet é um direito de todos.

A Finlândia se destaca em tecnologia mais do que os Estados Unidos da América.

Sim, na Finlândia se paga bastante impostos: 50% do PIB.

O país dá um banho nos Estados Unidos da América em matéria de educação e de não corrupção.

Na Finlândia se incentiva a colaboração, e não a competição.

Mas os neoliberais-gerenciais, privatistas, continuam a citar os EUA como modelo.

Difícil o Brasil chegar perto do modelo finlandês? Quase impossível. Mas qual modelo devemos perseguir? Com certeza não pode ser o da privatização.

Veja o seguinte documentário, imperdível, elaborado por estadunidenses. Em inglês, com legendas em espanhol:



Leia abaixo matéria originalmente publicada no Diário do Centro do Mundo que trata da excelência do sistema de educação da Finlândia, reverenciado em todo o mundo.

Por que o sistema de educação da Finlândia é tão reverenciado

Acaba de sair um levantamento sobre educação no mundo feito pela editora britânica que publica a revista Economist, a Pearson.

É um comparativo no qual foram incluídos países com dados confiáveis suficientes para que se pudesse fazer o estudo.

Você pode adivinhar em que lugar o Brasil ficou. Seria rebaixado, caso fosse um campeonato de futebol. Disputou a última colocação com o México e a Indonésia.

Surpresa? Dificilmente.

Assim como não existe surpresa no vencedor. De onde vem? Da Escandinávia, naturalmente – uma região quase utópica que vai se tornando um modelo para o mundo moderno.

Foi a Finlândia a vencedora. A Finlândia costuma ficar em primeiro ou segundo lugar nas competições internacionais de estudantes, nas quais as disciplinas testadas são compreensão e redação, matemática e ciências.

A mídia internacional tem coberto o assim chamado “fenômeno finlandês” com encanto e empenho. Educadores de todas as partes têm ido para lá para aprender o segredo.

Se alguém leu alguma reportagem na imprensa brasileira, ou soube de alguma autoridade da educação que tenha ido à Finlândia, favor notificar. Nada vi, e também aí não tenho o direito de me surpreender.
Finlândia: a melhor educação do mundo é 100% estatal,
gratuita e universal (Imagem: Reprodução/Documentário) 
Algumas coisas básicas no sistema finlandês:

1) Todas as crianças têm direito ao mesmo ensino. Não importa se é o filho do premiê ou do porteiro.

2) Todas as escolas são públicas, e oferecem, além do ensino, serviços médicos e dentários, e também comida.

3) Os professores são extraídos dos 10% mais bem colocados entre os graduados.

4) As crianças têm um professor particular disponível para casos em que necessitem de reforço.

5) Nos primeiros anos de aprendizado, as crianças não são submetidas a nenhum teste.

6) Os alunos são instados a falar mais que os professores nas salas de aula. (Nos Estados Unidos, uma pesquisa mostrou que 85% do tempo numa sala é o professor que fala.)

Isto é uma amostra, apenas.

Claro que, para fazer isso, são necessários recursos. A carga tributária na Finlândia é de cerca de 50% do PIB. (No México, é 20%. No Brasil, 35%.)

Já escrevi várias vezes: os escandinavos formaram um consenso segundo o qual pagar impostos é o preço – módico – para ter uma sociedade harmoniosa.

Não é à toa que, também nas listas internacionais de satisfação, os escandinavos apareçam sistematicamente como as pessoas mais felizes do mundo.

Para ver de perto o jeito finlandês de educar crianças, basta ver um fascinante documentário de 2011 feito por americanos (vídeo publicado acima).

Comecei a ver, e não consegui parar, como se estivesse assistindo a um suspense.

Todos os educadores, todas as escolas, todas as pessoas interessadas na educação, no Brasil, deveriam ver e discutir o documentário.


FONTE: ControVérsia

Comissão Pastoral da Terra: Nota Pública


CPT - Comissão Pastoral da Terra: Nota Pública - Ministra afronta a Constituição Brasileira



A Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra vem a público para manifestar sua indignação e repúdio ao que faz o atual governo federal, em defesa da sua visão monocrática de desenvolvimento e de submissão aos interesses do agronegócio.

A ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffman, no dia 8 de maio, em reunião da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, deixou claro qual é a verdadeira e única visão do atual governo em relação aos sérios e graves conflitos que envolvem os povos indígenas.

As diversas manifestações indígenas que vêm ocorrendo nos últimos anos, que mostram sua total discordância com projetos que afetam sua vida e seus territórios, são atribuídos pela ministra a grupos que usam o nome dos índios, tentando, com isso, desqualificar suas ações como se eles apenas  fossem massa de manobra nas mãos de outros interesses. “Não podemos negar que há grupos que usam os nomes dos índios e são apegados a crenças irrealistas, que levam a contestar e tentar impedir obras essenciais ao desenvolvimento do país, como é o caso da hidrelétrica de Belo Monte”, disse ela textualmente. E acrescentou: “O governo não pode concordar com propostas irrealistas que ameaçam ferir a nossa soberania e comprometer o nosso desenvolvimento”.  A ministra deixa patente que o econômico é o único compromisso do atual governo. Nada pode impedir que os propalados “progresso e desenvolvimento” avancem sobre novas áreas, desconhecendo totalmente os direitos dos povos que há séculos ali vivem e convivem, se assim o governo definir como essenciais ao desenvolvimento.

Com essa fala, ela acaba por legitimar toda a violência empreendida contra os povos originários no país. E confirma que o atual modelo de “desenvolvimento” é o mesmo que se implantou no Brasil, desde a época do Brasil Colônia, e se repetiu nos diversos períodos de nossa história. Esquece-se ela, porém, que a Constituição, em seu artigo 231 garantiu: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens” e que o Brasil é signatário de acordos internacionais que corroboram estes direitos. As declarações da ministra soam como uma afronta à Constituição brasileira. 

E não são só palavras. Para garantir que as obras que o governo se propõe realizar não sejam interrompidas, como nos tempos da ditadura militar, militariza-se a questão. Em 12 de março, a Presidente Dilma assinou o Decreto nº 7957/2013, que dá poderes ao próprio governo federal, através de seus ministros de Estado, para convocar a Força Nacional em qualquer situação que avaliarem necessário. E lá está a Força Nacional na região onde se pretende construir o complexo Hidrelétrico do Tapajós. E estava em Belo Monte para retirar os cerca de 200 indígenas de 8 etnias diferentes, que ocupavam o canteiro de obras da usina, depois que o governo conseguiu liminar da justiça para que os mesmos fossem retirados, até mesmo com o uso da força. Pacificamente como entraram, os indígenas deixaram o local.

E não fica só nisso. Nas regiões, onde os índios depois de decênios de espoliação, tentam reaver pequena parte do território que lhes pertencia, o Palácio do Planalto desqualifica os trabalhos da Funai propondo submeter os estudos de identificação e delimitação de terras indígenas à análise da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), contrariando, mais uma vez a legislação brasileira.

Aliado a isso tudo, a campanha anti-indígena que se desenvolve no Congresso Nacional com a PEC 215, que quer transferir as atribuições constitucionais da Presidência da República em reconhecer territórios indígenas e de outras comunidades tradicionais para o Senado, e a portaria 303 da Advocacia Geral da União que pretendia estender a todo o Brasil, as condicionantes definidas para a TI Raposa Serra do Sol, nos dão um quadro de como, depois de cinco séculos, os indígenas são vistos e tratados neste país.

A Coordenação da CPT espera que nossa Constituição seja respeitada em primeiro lugar pelo próprio governo, garantindo “aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam”, e também sobre os territórios dos quais foram espoliados. A preocupação da CPT se dá, também, com relação aos quilombolas e outras comunidades tradicionais sobre as quais cresce a pressão do capital, apoiado pelos poderes públicos.  É hora de respeitar e de garantir a diversidade presente em nosso país, e o espaço físico para reprodução física e cultural dos povos e comunidades existentes. 

Goiânia, 13 de maio de 2013.

Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT)


FONTE: Conselho Indigenista Missionário - CIMI

Normas da ABNT: as NBRs não se improvisam


 Por Aluizio Moreira

As exigências dos Cursos de Graduação (Bacharelado) com a introdução de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), somadas às já existentes para os Cursos de Pós-Graduação quanto à defesa de um Trabalho monográfico, fizeram surgir certas divergências entre professores e orientadores que de alguma forma atuam, direta e/ou indiretamente, nos meandros das Normas da ABNT.

Alunos portadores de diplomas de Cursos de Graduação que por algum motivo resolvem matricular-se um outros Cursos de Graduação em outras instituições de Ensino Superior, ou mesmo tendo concluído o Graduação ingressam em Pós-Graduação (lato ou stricto sensu), que já vivenciaram elaboração de Projetos de Pesquisa, defesas de monografias, nos apresentam determinados pontos de vista sobre Trabalhos Acadêmicos, Projetos, Artigos Científicos, em francas dissonâncias com as Normas elaboradas pela ABNT.

Vejamos alguns casos que nos foram apresentados:

- Projeto de Pesquisa de monografia não tem o item hipótese

Incorreto! A NBR 15287:2011 que trata de Projeto de Pesquisa, ao apresentar a parte Interna relativa à estrutura do Projeto, se referindo aos itens dos elementos textuais (Introdução, Desenvolvimento e Conclusão), esclarece que da Introdução devem constar exposição do tema, problema, HIPÓTESE, objetivos, justificativa.

- Artigo e Monografia podem ter como último elemento da parte textual Considerações Gerais

Incorreto! Uma simples consulta às Normas 6022:2003 e 14724:2011, deixa claro que a ultima parte dos elementos textuais do Artigo ou Monografia é CONCLUSÃO.

- Artigo Científico tem Sumário

Incorreto! A NBR 6022: 2003, referente a Artigo em publicação periódica cientifica impressa, ao tratar da sua estrutura (pré-textual, textual e pós-textual), só faz menção na parte pré-textual aos seguintes elementos:

a) titulo, e subtítulo (se houver), 
b) nome(s) do(s) autor(es), 
c) resumo na língua do texto; 
d) palavras-chave na língua do texto. 

Como vemos, não há qualquer alusão a palavra SUMARIO como elemento do Artigo. O Sumário é parte obrigatória na Revista ao publicar o referido Artigo.

 - Artigo Científico traz na parte pré-textual, logo após o resumo na língua do texto, o resumo em língua estrangeira

Incorreto! Se atentarmos para mesma NBR anterior (NBR 6022:2003), em Artigo Científico o Resumo em língua estrangeira faz parte dos elementos pós-textuais. Transcrevemos:

Os elementos pós-textuais são constituídos de:

a) titulo, e subtítulo (se houver) em língua estrangeira;
b) resumo em língua estrangeira;
c) palavras-chave em língua estrangeira;
d) nota(s) explicativa(s)
e) referências;
f) glossário;
g) apêndice;
h) anexo(s)

Neste particular, a confusão tem sua origem na NBR 14724:2011 que trata dos Trabalhos Acadêmicos, na qual ao expor o trabalho monográfico (Ver. neste blog nossa matéria “Trabalhos Acadêmicos e Atividades Complementares”,postada em 23/10/2011.) como forma usual, relaciona, entre os elementos pré-textuais, logo em seguida ao mencionado Resumo em língua vernácula, Resumo em língua estrangeira. Forma esta especifica para Trabalhos Acadêmicos, não para Artigos.

Fiquemos por aqui. Por enquanto.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Faculdade para brasileiros, lucro para o exterior


Fusão entre os grupos educacionais Kroton e Anhanguera evidencia avanço de grupos estrangeiros sobre faculdades particulares



Por Patrícia Benvenuti


Um negócio de R$ 12 bilhões, com um milhão de “clientes” e um faturamento de mais de R$ 4 bilhões por ano. Os números surpreendentes são os resultados da fusão entre os grupos educacionais Kroton e Anhanguera, anunciada em 22 de abril. 

Juntas, elas serão a maior companhia do mundo no setor de educação em valor de mercado. Serão mais de 800 unidades de ensino superior e 810 escolas associadas em todos os estados, somando cerca de um milhão de alunos em educação superior, profissional e outras atividades associadas ao ensino. 

A operação aguarda aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Apesar de tratada como fusão, a Kroton deverá predominar. Com um valor de mercado maior, a companhia terá 57,5% do controle, sete dos 13 assentos do conselho e a direção de Ricardo Galindo, atual presidente do grupo. 

O mercado efervesceu com a notícia. No dia do anúncio da fusão, os papéis da Kroton fecharam em alta de 8,39% e os da Anhanguera, em 7,76%. Já se especula que outros conglomerados possam realizar operações semelhantes para enfrentar o “gigante da educação”, como vem sendo chamada a nova companhia. 

“Cartelização”

A fusão, por outro lado, não foi bem recebida por entidades sindicais, estudantis e especialistas em educação. A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee) já anunciou que ingressará no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a operação. 

Além disso, acionará o Cade para impedir a realização do negócio que, segundo a entidade, promove uma “cartelização” no setor. Com a junção, Kroton e Anhanguera terão cerca de 15% do total de alunos de nível superior do país. 

Para o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Romualdo Portela de Oliveira, a presença do novo grupo deverá resultar em um oligopólio no mercado. “É de se esperar que o efeito sistêmico se amplie, do tipo abalar as instituições mais frágeis e começar a acentuar um processo de oligopolização”, afirma. 

A origem do capital também preocupa. A coordenadora-geral da Contee, Madalena Guasco Peixoto, lembra que os recursos que financiam essas negociações não são provenientes de instituições internacionais de ensino, e sim de agentes que esperam lucratividade. “Esse pessoal é do capital financeiro aberto, especulativo. Eles não têm o mínimo interesse com a qualidade da educação”, adverte. 

Quem é quem

No setor de educação há mais de 40 anos, o Grupo Kroton atua em diferentes estados. Algumas de suas marcas mais conhecidas são a Faculdade Pitágoras e a Universidade Norte do Paraná (Unopar), especializada em ensino à distância. 

Em 2007, a Kroton abriu seu capital na Bolsa de Valores, mas atraía pouca atenção dos investidores. A situação mudou em 2009, com a entrada da Advent, um fundo internacional de private equity (que compra participação em empresas) dos Estados Unidos. A partir daí, seu valor de mercado saltou de R$ 400 milhões para quase R$ 7 bilhões. No Brasil, a Advent também é acionista de empresas de alimentação e construção civil. 

A Anhanguera Educacional é mais presente nos estados do Sul e em São Paulo. Em 2011, a empresa comprou a Universidade Bandeirante de São Paulo (Uniban) por R$ 510 milhões. Um dos controladores da Anhanguera é o Fundo de Educação Para O Brasil – Fundo de Investimento em Participações, administrado pelo Banco Pátria. 

O perfil dos investidores é semelhante em outras grandes instituições. A Estácio de Sá, por exemplo, tem a GP Investments como principal acionista. Já a Anhembi Morumbi, de São Paulo, é 100% controlada pela rede estadunidense de ensino superior Laureate, que tem entre seus sócios o fundo de investimento KKR, também dos Estados Unidos. 

“Há um processo de financeirização e, mais do que isso, uma desnacionalização do ensino”, aponta o presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE), Daniel Illiescu. 

Ele estima que, atualmente, metade dos estudantes de faculdades privadas do país esteja vinculada a uma escola controlada por grupos internacionais. 

Mercantilização 

O interesse do capital especulativo sobre as faculdades privadas, para o professor do Programa de Pós-graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Gaudêncio Frigotto, é uma evidência de que a educação virou um bem de consumo. “A educação já não é tida como um direito, mas é tratada como um serviço e uma mercadoria sobre o qual se negocia”, diz. 

O processo de mercantilização da educação no Brasil seguiu a corrente da lógica privatista neoliberal. Na década de 90, o governo federal concedeu incentivos para que as faculdades deixassem de ser geridas por fundações e se transformassem em empresas. A partir dos anos 2000, os grupos econômicos começaram a abrir seu capital na Bolsa, atraindo investimentos estrangeiros. 

De acordo com o professor Romualdo Portela de Oliveira, alguns fatores contribuíram para aumentar o interesse dos especuladores sobre o país nesse período. Um deles foi o aumento das taxas de conclusão do Ensino Médio, que possibilita um número maior de matrículas no ensino superior. 

Outros pontos foram o aumento da renda média das famílias e incentivos governamentais como o Programa Universidade para Todos (ProUni) e o Financiamento Estudantil, o Fies. “É um mercado muito promissor para o setor privado lucrativo”, explica. 

Não por acaso, a Kroton e Anhanguera têm seu foco sobre as classes C e D, consideradas o grande filão do mercado. A mercantilização, porém, tem ido muito além das faculdades. 

Gaudêncio Frigotto lembra que quase todas as editoras didáticas nacionais já foram compradas por grupos estrangeiros, e uma série de fundações de empresas privadas estabelece cada vez mais convênios com o poder público na área do ensino. “É o capital do mundo entrando no quintal do Brasil”, diz o professor. 

Negócios à parte, quem fica prejudicada é a qualidade do ensino. Para a 1º vice- presidente regional do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) em São Paulo, Ana Maria Ramos Estevão, a ideologia mercantilista de ensino terá reflexos sobre a formação dos jovens. “Como a preocupação fundamental é com o lucro, e não com a produção de conhecimento, vão oferecer uma educação voltada para o mercado”, afirma. 

Precariedade

As faculdades comandadas por grupos estrangeiros são alvo de uma série de denúncias de irregularidades. Ana Maria conta que o Andes-SN recebe, diariamente, notícias de professores que são demitidos depois de obterem sua titulação de mestrado ou doutorado, o que os qualificaria a receber um salário maior. Foi o que ocorreu quando a Anhanguera comprou a Uniban. Centenas de professores foram dispensados, causando revolta entre os alunos. 

Também é comum que as instituições demitam os docentes depois de os cursos obterem reconhecimento junto ao Ministério da Educação (MEC). “Terminou o reconhecimento, mandam todo mundo embora e contratam gente que nem tem especialização, só graduação”, relata Ana Maria. 

Existe ainda o chamado “rodízio” de profissionais – que ocorre quando um mesmo professor é enviado para trabalhar em várias unidades, às vezes em municípios diferentes. O objetivo da manobra é fazer com que todos os locais da instituição tenham, no papel, o número mínimo de docentes exigidos pelo MEC. A infra-estrutura também deixa a desejar, com falta de bibliotecas e laboratórios. Em vez disso, as faculdades se apóiam cada vez mais no Ensino á Distância (EaD). 

De acordo com a Portaria 4.059/04 do Ministério da Educação, até 20% do curso presencial de graduação pode ser realizado por meio de atividades desse tipo. Segundo o presidente da Federação dos Professores do Estado de São Paulo (Fepesp), Celso Napolitano, é mais uma forma de as faculdades reduzirem custos. “A Anhanguera não tem aula nas sextas. Com isso economizam 20% da folha de pagamento. Isso acontece como um todo no ensino particular privado”, afirma. 

O tratamento dispensado aos alunos é outro ponto problemático. Além de dificuldades em dialogar com as direções, o presidente da União Nacional dos Estudantes relata que as faculdades mantêm a prática de “catracar” os estudantes inadimplentes, impedindo-os de acessar as dependências da faculdade. “São medidas que colocam o lucro à frente do direito do estudante de entrar na faculdade”, pontua Daniel Illiescu. 

Regulamentação

Com a concentração do setor, a tendência é de que as condições de estudantes e trabalhadores sejam ainda mais precarizadas. Segundo o deputado federal Ivan Valente (Psol-SP), a Comissão de Educação da Câmara promoverá uma audiência pública para debater a fusão entre a Kroton e a Anhanguera e a participação de capital internacional na educação brasileira. 

Valente é autor do Projeto de Lei nº 2.138/2003, que proíbe a entrada de capital estrangeiro nas instituições educacionais brasileiras. A matéria, no entanto, encontra dificuldades para seguir adiante. “[O projeto] está tramitando na Casa sempre com parecer contrário, dado por deputados ligados ao lobby das empresas particulares que financiam as suas campanhas”, explica o deputado. 

A falta de regulação no setor privado de ensino é apontada como uma facilidade para atuação dos grupos internacionais. O projeto de Reforma Universitária proposto pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva limitava em até 30% a participação de capital estrangeiro. No entanto, a proposta também esbarrou em interesses contrários. 

Para Madalena Guasco Peixoto, da Contee, é preciso que o Estado assuma seu papel de fiscalizar e regular a atuação das faculdades privadas. Nesse sentido, a tarefa mais urgente é impedir a concretização do negócio entre a Kroton e a Anhanguera. “É da responsabilidade do Estado impedir isso porque, no dia em que não tiverem mais interesse em ganhar dinheiro com ações de instituições educacionais, vão deixar para o Estado brasileiro um milhão de estudantes sem instituição”, adverte.

FONTE: Brasil de Fato

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