sábado, 24 de agosto de 2013

Duvidoso modelo de cárceres privadas dos EUA se populariza


IPS-Adital
Por Carey L. Biron

Tradução: ADITAL

Em quase todas as regiões do mundo, há países que adotam um sistema penitenciário privado promovido pelos Estados Unidos, apesar de que a evidência acumulada mostra que não são rentáveis e nem oferecem serviços adequados.

Novos dados divulgados na terça-feira (20/8) revelam que quase uma dezena de países na África, na América do Norte, na América do Sul, na Ásia Pacífico e na Europa instauram centros de detenção privados com fins de lucro em seus sistemas penais.

A Corporação de Correcionais da America
tem 80.000 reclusos em 60 centros de
detenção, 40 dos quais são de sua
propriedade. Crédito: Bigstock
O modelo surgiu nos Estados Unidos, onde agora se tenta diminuir a população carcerária. Isso derivou na exportação de conhecimentos sobre penitenciárias privadas.

O crescente interesse internacional "ajudou as companhias de cárceres privados dos Estados Unidos a diversificar seus investimentos em um momento em que o número de reclusos nesse país se estancou”, informa um estudo divulgado por Sentencing Project, um grupo de estudo com sede em Washington.

"Por exemplo, 14% dos ingressos da segunda maior companhia do setor nos Estados Unidos, Geo Group, procederam dos serviços internacionais no ano fiscal de 2012”, ilustra o relatório.

O crescente interesse mundial na privatização de cárceres foi também uma bênção para as empresas britânicas, em particular para G4S e Serco.

Todas essas companhias "prosperaram devido à privatização generalizada de penitenciárias e dos sistemas de detenção de imigrantes, entre outros serviços do Estado”, explica o relatório, "apesar de que, em geral, não cumprem com os serviços prometidos”.

De fato, inúmeros críticos acusam as companhias carcerárias, com requisitos explícitos de recortar fundos, de oferecer condições e serviços piores do que os sistemas estatais (para mais informação a respeito, pode ler aqui e aqui).

Em 2009, a Corte Suprema de Justiça de Israel bloqueou uma iniciativa do governo para abrir uma prisão privada. O alto tribunal alertou que a transferência de tal responsabilidade "atentaria dura e gravemente contra os direitos humanos dos presos”.

As empresas costumam justificar suas operações em termos de maior eficiência do serviço.

A Corporação de Correcionais da América (CCA), fundadora dessa tendência a princípios dos anos 80 e atualmente a maior companhia do setor nos Estados Unidos, explica que "combina a eficiência e a efetividade empresarial com padrões, normas e controles estatais por menos dinheiro do que requerem nas agências públicas para funcionar”.

CCA indicou que tem 80.000 reclusos nos 60 centros de detenção, 40 dos quais são de sua total propriedade.

Porém, organizações e governos criticam cada vez mais o argumento de rentabilidade desse modelo. Um organismo de controle do estadunidense Estado de Arizona concluiu em 2010 que as prisões privadas custavam 16% mais do que as públicas.

No mês passado, em relatório pouco usual, o movimento Anonymous alertou que já não era rentável investir na CCA.

Histórias de conquistas

Os países que atualmente contam com cárceres privados ou estão por implementá-los incluem o Brasil, o Chile, a Grécia, a Jamaica, o Japão, o México, o Peru, a África do Sul e a Tailândia, apesar de que o setor continua dominado pelas nações ricas e, em especial, pelas anglo-saxônicas, indica o relatório de Sentencing Project.

Os Estados Unidos têm mais presos em cárceres privadas, uns 131.000, em 2011. Isso se deve em grande parte a que também é o que mais pessoas prende, 1.5 milhões, ao redor da quarta parte da população carcerária do mundo.

Porém, vários países mais cederam uma parte maior de seus sistemas penais a companhias privadas. Segundo os últimos dados, a Austrália, a Grã Bretanha e a Nova Zelândia têm entre 10 e 20% de seus presos em recintos privados.

Os números aumentam quando se trata de centros de detenção de imigrantes, um rubro no qual se destacam particularmente as empresas privadas.

A Grã-Bretanha, por exemplo, mantém três em cada quatro pessoas acusadas de infringir normas de imigração em instalações privadas. A Austrália, por seu lado, privatizou totalmente os cárceres para imigrantes.

"Como há grandes países desenvolvidos que avançam nessa direção, naturalmente isso gera interesse em outros países”, explicou Cody Mason, autor desse último relatório e consultor de Setencing Project.

Empregados de "companhias privadas nos Estados Unidos e em outros países, costumam viajar e convidar aos legisladores para conhecer suas instalações, com o que dão a entender que seu enfoque resolverá seus problemas. Fazem autopromoção como a grande alternativa para resolver a superlotação, os serviços padrões e o aumento do custo das prisões”.

Novos mercados

Nos Estados Unidos, a superlotação dos cárceres tornou-se um grande problema após três décadas de uma política de "tolerância zero contra a delinquência”, promovida pelos legisladores.

A superpopulação em algumas prisões excede 40% de sua capacidade e derivou em acusações de massivas violações aos direitos humanos.

No dia 12 de agosto passado, o fiscal geral, Eric Holder, realizou um anúncio considerado histórico, no qual pede ao Departamento de Justiça que comece a tomar medidas para diminuir a população carcerária.

Há outras disposições em marcha no âmbito do Congresso legislativo para implementar mudanças permanentes no funcionamento do sistema penal.

Esse tipo de medidas poderiam derivar no fim bipartidário da era da "Tolerância zero”; porém, sem dúvida, inquieta as companhias de cárceres privados dos EUA.

Todavia não está claro como o lobby empresarial poderá ser fortalecido no marco dessa nova tendência; porém, Cody Mason opinou que já gastaram milhões de dólares em medidas de pressão em torno a ela.

O lobby empresarial concentrou-se na revisão pendente do sistema de imigração. O relatório de Mason assinala que as companhias têm "antecedentes de contribuir com os defensores de leis duras para a detenção de imigrantes” sem documentos.

Segundo cifras oficiais, este ano, o governo federal deterá umas 400.000 pessoas por infringir normas imigratórias, o que lhe custará uns 2 bilhões de dólares.

Porém, um novo projeto de lei, aprovado pelo Senado, mas no limbo na Câmara de Representantes, dará lugar a mudanças que, certamente, serão significativas.

"Com certeza, haverá uma resposta corporativa para essas questões, em especial em função do que acontecer ao projeto de lei de imigração. As companhias têm um grande interesse nisso”, indicou Mason.

"Porém, além da pressão que possam fazer, também buscam outros nichos de mercado, e parte disso é expandir-se para outros países”, agregou.

FONTE: Adital

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