quinta-feira, 25 de agosto de 2016

Porque sou candidato a vereador do Recife


Por Aluizio Moreira



Professor universitário, atuei na politica desde estudante do ensino médio militando nos quadros do PCB, passando pela universidade, pelo exercício da docência, até meu afastamento da política partidária em 1988. Hoje, com muita honra, o Partido me convocou, mais uma vez à luta, lançando minha candidatura a uma vaga na Câmara Municipal  da cidade do Recife.

Longe de ser um projeto pessoal, sou candidato a vereador porque como grande parte da população do meu país, do meu Estado, do meu município, cansamos da velha forma de fazer politica, ouvindo promessas não cumpridas. que vão da melhoria do sistema de esgotos e calçamento de ruas, à melhoria da educação e da saúde. 

Somos convocados sempre para escolher senadores, deputados, prefeitos e vereadores, e nada acontece, a não ser perda dos direitos de quem trabalha, de quem se aposenta. Continuamos mendigando saúde para todos, educação para todos, segurança para todos, melhoria das condições de vida, e continuamos sem perspectiva de futuro, pois a elite no poder, a serviço do capital, sempre cria obstáculos, promove retrocessos a cada conquista que o povo alcance, seja através dos poderes constituídos, seja através de golpes de todos os matizes (civil, militar e político-parlamentar)

Precisamos de mudanças efetivas que jamais virão por iniciativa do Governo. As mudanças só acontecerão com o povo organizado nas suas comunidades, nas suas associações, nas suas universidades, no seu trabalho, nos seus sindicatos, nos seus bairros, ou seja, o Brasil só será um país de todos quando conquistar o Poder Popular, rumo ao socialismo.

Pretendo transformar meu mandato, abrindo as portas da Câmara para todos os cidadãos do meu município, mas também indo ao encontro do cidadão nas comunidades, nas associações, nos sindicatos, nos bairros.

Clamo todos homens e mulheres que fazem parte da população do Recife, de qualquer credo político ou religioso, de qualquer classe ou camada social, sem distinção de raça, de cor, de opção sexual, a exercerem o voto com a  perspectiva de mudança de rumos para este município, este Estado, este País, não apenas mudando  os homens e os partidos que eternamente se revezam no poder, mas mudando os programas de governo, os modos de gestão priorizando os trabalhadores, os menos favorecidos e os excluídos.

Isto tudo não é tarefa para uma pessoa só. As mudanças estão nas mãos de todos nós, do Povo trabalhador organizado e com certeza a verdadeira democracia, vai muito além do depósito do voto numa urna, passa também, pelo exercício pleno da verdadeira cidadania. 

A verdadeira democracia não está no Poder que como eleitores, delegamos aos outros, mas no Poder que construiremos todos nós, juntos: do apanhador de papelão e resíduos sólidos ao operário, aos trabalhadores rurais, aos sem terras, aos sem tetos, às minorias excluídas, à intelectualidade deste País.

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

Olimpíadas 2016: O desporto é o que menos importa


Por  Mauro Iasi*     


Os Jogos Olimpicos do Rio de Janeiro não cumpriram as metas fixadas pelo Comité Olímpico.
Para poupar energia a pira Olímpica foi muito menor do que o previsto.O tratamento do esgoto lançado na Baia da Guanabara não atingiu metade da meta estabelecida. As obras de limpeza dos rios da bacia de Jacarepagua foram paralisadas em 2015, apesar de a empresa responsável ter recebido 235 milhões de reais. Mais de 77000 pessoas foram desalojadas das suas residências para criar terrenos destinados a futura especulação imobiliária. Não obstante a mobilização de 85000 policias, a segurança das delegações funcionou muito mal. Muitos atletas foram assaltados e roubados dentro e fora da Vila Olímpica.-O desporto, como lembra Mauro Iasi, foi no Rio16 o que menos importou aos organizadores.
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Um pouquinho, sinhá, só um pouquinho. Uma parte não se mostra naquilo que se apresenta como imagem ideológica. Seleciona-se, assim como os atletas em busca do índice olímpico, aquilo que aparecerá na imagem refletida do real.

Este é um Brasil que canta e é feliz, este é um país em que uma menina negra da favela chega ao ouro, este é um país que se esforça muito, luta diariamente vencendo obstáculos. Este é um Brasil, no entanto, que canta porque é triste, no qual crianças negras são abatidas a tiros nas favelas, em que os juízes saem para jantar com os vencedores, um país em que se trabalha muito e se ganha pouco enquanto poucos ficam com quase tudo. Como nas Olimpíadas.

Como em toda imagem ideológica, as Olimpíadas também mostram e demonstram muito naquilo que escondem. Não é uma mera falsidade, pura manipulação. Isto aqui, sinhô, é bastante do Brasil. Os jogos são um funil seletivo no qual passam apenas os melhores entre os melhores, os campeões, os semideuses olímpicos, que disputam poucos lugares no pódio e só um pode ser de ouro. A livre concorrência entre indivíduos desiguais em condições, igualados pelas regras comuns da disputa. Iguais em direito, desiguais de fato. Indivíduos, heróicos, enfrentando dificuldades até alcançar os louros da vitória.

Mas, isso é o óbvio. Uma outra dimensão se insinua de forma mais sub-reptícia. Há vagas especiais para aqueles que não atingiram os índices, para que todos os países participem como convidados, há equipes para abrigar os refugiados e, depois, há as Paraolimpíadas. Todos os círculos, de todas as cores, se irmanam num abraço como as argolas do mágico que com perícia esconde o truque. A mensagem para o mundo é a importância de cuidar da natureza e do equilíbrio ambiental, a paz mundial, assim como a importância da educação e do cuidado com as crianças.

Vejam, não há nada de errado neste discurso, assim como não há nada de errado nos jogos, na emoção da disputa, no reconhecimento do esforço dos atletas, na beleza dos esportes. A dimensão ideológica atua em outra dimensão que exige um pouco de distanciamento.

Os jogos que defendem o equilíbrio ambiental, por exemplo, não cumpriram com suas metas. Fizeram uma Pira Olímpica menor, para economizar energia, mas na conta da compensação de carbono resta um déficit de 31% por conta do replantio insuficiente de mudas em relação a emissão de gases associados às obras para receber o evento. O esgoto jogado na Baía da Guanabara, cuja promessa seria tratar 80%, não chegou nem à metade da meta. A limpeza e canalização dos rios da bacia de Jacarepaguá, segundo os dados da “Jornada de lutas: Jogos da Exclusão”, tiveram suas obras paralisadas no final de 2015, com um ano de atraso no prazo previsto, e sem nenhum resultado, apesar das empreiteiras Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia terem abocanhado a bagatela de R$ 235 milhões pelas obras.

Enquanto se festeja a inclusividade dos jogos, a generosa inclusão de nações sem índice olímpico ou a oportunidade para refugiados (alguns vindos de países que foram bombardeados pelas nações européias que depois se negaram a recebê-los em seus territórios), os megaeventos desalojaram mais de 77 mil pessoas desde 2009. No Rio de Janeiro, inúmeras famílias foram desalojadas na Vila Autodromo, Vila Recreio II, favela Metro Mangueira, Vila Harmonia e outras muitas apenas para criar terrenos vazios para a futura especulação imobiliária.

Pombinhas de papel simbolizam a paz no mundo e a cidade é tomada pelo exército e a polícia. A ocupação na Maré, durante a copa do mundo em 2015, consumiu R$ 599 milhões em 15 meses. Os organizadores dos “Jogos da Exclusão” estimam que entre 2010 e 2016 a prefeitura do Rio investiu R$ 303 milhões em programas sociais em todas as favelas da cidade. O conjunto dos gastos com segurança podem chegar aos 3 bilhões de reais. Os assassinatos cometidos por policiais cresceram 135% em um ano.

Pessoas são retiradas dos estádios por expressar sua posição contra o governo ilegítimo instalado em Brasília e uma lei da mordaça cai sobre os atletas. Enquanto os fogos iluminavam a noite da cidade, a policia descia a porrada nos manifestantes em outro canto.

Mas, o que o esporte tem a ver com tudo isso? Ele não é o culpado pelas razões que levam aos meus queixumes políticos, nem com a ganância das grandes empresas que esfolam mercantilisticamente o evento. Essa é uma questão difícil.

Atletas treinam muito e com dedicação, uns com mais apoio, outros sem nenhum, mas o que importa é que neles podemos ver, algumas vezes, isso que um certo Barão, Pierre de Coubertin, chamou de “espírito olímpico”. E isso é muito bom de se assistir e deve ser ainda mais legal participar. Mas, pesa como maldição de todo “espírito” habitar um “corpo”, objetivar-se e, em certas condições, estranhar-se. A materialidade olímpica é a intensa utilização desse valor de uso para servir de base para o seu valor de troca. Sua transformação em mercadoria, sua mercantilização intensa, independe das formas próprias de seu valor de uso e muito menos das intenções de seus protagonistas, aliás como em todo processo de produção de mercadorias.

O esporte é o que menos importa. O Ministério do Esporte, que quase nunca usa a verba que lhe é atribuída, disponibilizou cerca de 190 milhões para bolsas para aqueles que alcançam índices e podem disputar vagas no esporte de competição. É quase o valor pelo qual o Maracanã foi vendido, cerca de 180 milhões a serem pagos em 30 anos, apesar das obras terem chegado ao estratosférico valor de 1,34 bilhão. Programas de massificação do desporto, formação, estruturas de qualidade, como sempre são abandonados e seus recursos mínguam.

Ao final, as medalhas distribuídas, os lucros das empreiteiras, dos conglomerados de comunicação, dos monopólios envolvidos contabilizados, nossa emoção catártica realizada, a cidade voltará ao seu “normal”. A Universidade Estadual do Rio de Janeiro seguirá sua crise, os professores do ensino fundamental seguirão com seus salários atrasados, as carcaças de estruturas descartáveis apodrecerão como testemunhas silenciosas do desperdício e da ostentação.

Ai sinhô, ai, ai, sinhá… tem mais uma coisa que está aqui e vai seguir depois:
É também um pouco de uma raça
Que não tem medo de fumaça ai, ai
E não se entrega não.

(Publicado no Blog da Editora Boimtempo em 10 de Agosto de 2016)


*Mauro Iasi é escritor, dirigente do Partido Comunista Brasileiro e foi candidato à Presidência da República


FONTE: ODiario.info

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Eleições para além dos limites dos Municípios


Por Aluizio Moreira



Estamos próximos das eleições para o Executivo e Legislativo Municipais neste ano de 2016. A maioria dos eleitores ou não dão muita importância à eleição para vereadores, ou admitem que o papel do vereador é além de “acompanhar s ações do poder executivo”, procura apenas defender os interesses do município e ao bem-estar da população local, preocupando-se exclusivamente com o saneamento básico, educação fundamental, saúde, transporte coletivo, moradia, coleta de lixo, iluminação pública, proteção ambiental, etc. 

É evidente que tudo que traga melhorias para as condições de vida é importante para a população local. Mas é necessário também que o cidadão em sua cidade, compreenda que muitas dos serviços diretamente ligados ao município, têm relação direta com o que acontece na esfera dos poderes políticos no Estado, como da politica adotada a partir do Congresso Nacional e pelo direcionamento político e econômico dado pelo Governo Federal. 

Daí a importância que devemos empreender, não só acompanhando as decisões e acontecimentos ao nível do Estado e do Município, como acompanhando as decisões e os acontecimentos ao nível de Governo Federal. Os fatos que acontecem a nível de Governo Federal, trazem graves consequências para a população local. Ou seja, o cidadão não deve apenas se limitar a reivindicar melhorias para seu município, mas também voltar sua atenção para as políticas traçadas pelo Governo Federal,  apoiando-as ou não. 

Está aí o Governo de Michel Temer, acenando para “mudanças” que fatalmente atingirão todo o cidadão comum nas cidades mais afastadas dos centros de decisões politicas. As alterações que se farão relativas à lei da aposentadoria, à saúde publica, ao sistema de ensino (Fundamental e Superior), às questões das mulheres, aos movimentos sociais e das minorias excluídas (negras, indígenas, LGBT), aos Direitos Humanos, trarão sérias consequências, obviamente, para todo e qualquer cidadão, onde quer que ele habite.

Por outro lado não podemos nos limitar apenas em defender um Governo nos marcos de uma democracia, cada vez mais exclusiva, que começa e termina nas eleições. 

As conquistas que o povo brasileiro conseguiu alcançar pela luta das forças democráticas e populares, estão sempre ao sabor dos interesses das tendências da classe burguesa no poder: ora avançando por influencia da corrente liberal chamada progressista, ora retroagindo por imposição da corrente conservadora.

Até quando nosso povo viveremos, ao sabor das forças burguesas hegemônicas no poder? Quando teremos nossas conquistas asseguradas e constantemente avaliadas e aperfeiçoadas em beneficio da maioria da população sem o perigo de retrocessos? Na medida em que o povo conquiste a verdadeira democracia, com a instituição do Poder Popular, que ponha um fim ao Governo Representativo, que se foi um avanço com a instituição do voto universal e secreto, tornou-se um seu oposto, cujos representantes não representam os interesses dos representados. 

Bem que a Câmara de Vereadores poderia ser um dos espaços de uma verdadeira representação popular, juntamente com os diversos setores das populações nos sindicatos, nas comunidades, nas organizações étnico-raciais, nas sedes do movimento LGBT.  

Tudo vai depender da vontade e da organização popular, a começar pela renovação da Câmara que não deve se limitar a uma simples troca de nomes, mas eleger aqueles que apresentem uma proposta socialmente mais igualitária, mais humana.
  

segunda-feira, 8 de agosto de 2016

Eleições 2016: O Contexto



Selvino Heck (*)


As eleições municipais de 2 de outubro são, no momento em que escrevo, 29 de julho, imprevisíveis. Ninguém sabe o que vai acontecer. Escrevo como alguém que participa de eleições desde 1978, 38 anos atrás, foi candidato seis vezes, a primeira vez em 1982, coordenou inúmeras campanhas, como a de Lula no Rio Grande do Sul em 1989, ou a de Tarso Genro, prefeito eleito de Porto Alegre em 1992. Até chegar a esta de 2016, onde estarei na coordenação de campanha de Cesar Schumacher, candidato a prefeito do PT de Venâncio Aires, minha terra.

Pergunto às pessoas em quem vão votar e por que. Quase ninguém sabe. Quando sabe, vota numa pessoa da qual ouviu falar ou já conhecia, e nada mais. Quase ninguém está ligado às eleições, por enquanto. Pergunto aos candidatos como vão tratar os temas do impeachment, do golpe e da democracia e há muitas dúvidas. Pergunto sobre o quadro econômico e social previsível em 2 de outubro, e as respostas são múltiplas ou vagas.

Estas eleições, mesmo sendo municipais, são especialmente importantes, por acontecerem no momento em que estão acontecendo, por possibilitarem o levantamento de temas antes quase proibidos em eleições municipais, por exigirem dos candidatos majoritários e proporcionais posicionamentos e respostas sobre assuntos que vão além da questão local, obrigando a discutir o micro e o macro, políticas públicas, a democracia e assim por diante.

Agosto é um mês marcado na história no Brasil, a começar pelo suicídio de Getúlio em 24 de agosto de 1954. Em agosto de 2016, o Senado da República decidirá sobre o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. Agosto será o mês de inéditas Olimpíadas no Brasil e na América Latina, que deveriam/deverão envolver e empolgar toda sociedade brasileira e ter repercussão mundial. Agosto será um mês de grandes manifestações sociais e de rua, talvez com uma greve geral há muito tempo não vista.

Como o Brasil chegará no final de agosto? Como estará em setembro? Ninguém sabe, ninguém pode/consegue prever.

Recentes pesquisas, algumas inclusive fraudadas, como a do Datafolha, dão conta que está acontecendo uma mudança no humor popular de brasileiras e brasileiros. Cai a aprovação do governo interino golpista, sobe a aprovação da presidente legítima, Dilma, diminuem os favoráveis ao seu impeachment, cresce o número dos que querem eleições gerais.

No campo econômico e social, não se vê crescimento econômico no horizonte, aumenta a taxa de desemprego e as pessoas reclamam da inflação que corrói seus ganhos. Cresce, portanto, a insatisfação popular com a máxima do `Estado mínimo, mercado absoluto`. O desmonte das políticas públicas existentes, promovido pelo governo interino, começa a ser sentido na vida cotidiana do povo e dos trabalhadores.

Cresce o descrédito da política em geral, dos políticos e partidos em particular, ainda mais com as últimas medidas do governo interino chanceladas pelo Congresso Nacional, favorecendo minorias e não ao conjunto da população: reajuste dos servidores do Poder Judiciário e Legislativo, aceleração de privatizações, previsão de reformas na previdência e nas leis trabalhistas. E ainda há as denúncias de corrupção, a parcialidade de setores do Poder Judiciário e Ministério Público nas apurações, novidades que poderão surgir.

Há forte criminalização da política, especialmente do Partido dos Trabalhadores, e de alguns movimentos sociais, como o MST. Crescem o ódio a intolerância com quem é diferente ou pensa diferente da maioria, com quem professa determinadas crenças, com quem não professa a `lei e a ordem`. Os valores da solidariedade, da igualdade andam em baixa, a grande mídia colaborando expressivamente com seu esvaziamento e perda de sentido.

Como tudo isso se refletirá no voto daqui a dois meses? Ou os eleitores vão continuar com o olhar apenas no plano local, votando em nomes em vez de programas e partidos, sem atentar para as questões globais e nacionais? Quem o sabe?

Neste contexto, é de se imaginar que nesta eleição não haverá como escapar da disputa de projetos de sociedade e de desenvolvimento, haverá confronto de ideias, haverá embates programáticos, haverá debate sobre o futuro, não só do município, mas também do país. Ou todos fugirão de temas como a democracia, políticas públicas com participação social, papel do Estado e da sociedade civil em tempos de crise?

É de se lembrar ainda que, pela primeira vez, está proibido o financiamento empresarial de campanhas, levando a militância voluntária à rua, uma campanha pé no chão e no barro.

As eleições municipais de 2016, embora ainda imprevisíveis no resultado, são especialmente importantes no atual contexto brasileiro e no futuro do Brasil como Nação. Dois meses que entrarão para a história. Cabe a candidatas e candidatos, a militantes, à população em geral preocupada com o futuro de seus filhos e netos transformar estas eleições numa vitória da democracia e do resgate da política como serviço ao bem comum.



(*) Diretor do Departamento de Educação Popular e Mobilização Cidadã e Secretaria Geral da Presidência da República. Membro da Coordenação Nacional do Movimento Fé e Política e Secretário Executivo da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO)


FONTE: Adital

terça-feira, 2 de agosto de 2016

A lógica do sistema de poder brasileiro



O que fazer após o afastamento da presidenta Dilma Rousseff, concretizado no dia 12 de maio? O Le Monde Diplomatique Brasil convidou pensadores e lutadores sociais de diversos matizes para debater como lidar com a crise e trabalhar com certos elementos, como a guerra das ideias, as eleições municipais de outubro. 


Por Carlos Humberto Campos





As primeiras medidas do governo ilegítimo de Temer revelam a desconstrução e a negação dos direitos e conquistas das classes trabalhadoras e das comunidades tradicionais, bem como da luta por uma justa reforma agrária.

Construir os caminhos da resistência vai exigir maior politização e mobilização dos setores sociais. Vai demandar também o retorno e o restabelecimento da capacidade do trabalho político de base, exigindo uma verdadeira reforma política, cujo modelo atual se configura como um perverso sistema de poder, sustentado pelos grandes meios de comunicação corporativos que historicamente criminalizam os movimentos sociais e a política.

A luta dos movimentos sociais precisa incorporar e assumir o debate da comunicação de forma mais efetiva, para além dos produtos de informação e visibilidade. A comunicação necessita ser reconhecida como instrumento de mobilização e educação política e elemento fundamental na garantia de outros direitos e consciência da cidadania. Democratizar a comunicação é democratizar o sentido da vida, da luta e da resistência dos povos. A comunicação é um alimento básico da democracia.

O momento sociopolítico que a sociedade brasileira atravessa é delicado, sobretudo porque é também de construção das eleições municipais de outubro. Vivemos uma conjuntura pré-eleitoral, que tem um papel importantíssimo na rearticulação das forças políticas sociais nos municípios, base definidora e receptora das políticas públicas. Cabe ao município organizar o atendimento à população na área de saúde, educação, saneamento básico, água e esgoto, lazer, geração de trabalho, assistência social, moradia e transporte coletivo.

As eleições municipais que se aproximam não podem ser vistas apenas como um processo de escolha dos novos prefeitos e vereadores. Elas devem motivar a discussão de alternativas e projetos que garantam melhor qualidade de vida às pessoas. São importantes, pois trazem em seu bojo possibilidades de reencontro das forças políticas locais para a construção do debate, suscitando alternativas de administração pública mais próxima dos cidadãos e criando oportunidades de resgatar a importância do município como base na construção de um novo projeto para o país, onde todas as pessoas possam viver com dignidade. Temos de oxigenar e nutrir o processo das eleições municipais, na perspectiva de superação da crise política de hoje, pois é o município a base da organização política.

Resolver a crise sociopolítica atual passa pela superação de vários aspectos. Não é uma tarefa fácil. Inexoravelmente, exige uma renovação de todos os sujeitos, eleitos e eleitores, mudanças de atitudes, comportamentos pessoais e coletivos. A crise é estrutural, tem suas raízes no projeto de Brasil construído historicamente com estruturas injustas, viciadas e alimentadas pela prática do patrimonialismo corporativista e oligárquico. O vírus oportunista e corruptível reside no conjunto da obra.

Esta crise desnuda a lógica de um sistema de poder, de um paradigma que não dá mais conta de recompor-se e reabilitar-se. É preciso extirpar o modelo com uma autêntica reforma política, sair da democracia representativa para a participativa direta, o povo votando sobre todas as decisões importantes diretamente. É outra lógica, outro olhar, outra imagem de fazer política como a arte do bem comum.

A superação da atual crise política não virá por decreto ou medidas unilaterais; ela nascerá da capacidade de reconstrução de formas de convivência e de explicitação de vivências solidárias e respeitosas, até então pouco valorizadas.

É dessa perspectiva que surgem possibilidades de reações que nos impelem a desconstruir o “velho”, o “arcaico”, que sempre justifica a ordem estabelecida, e construir o “novo”, a nova ordem. Isso requer um processo longo de desenvolvimento humano e social, mas é uma condição necessária para as pessoas crescerem na consciência humana, social, política e econômica. A ação política é humana, por isso ela tem de ser humanizada!



Carlos Humberto Campos é sociólogo, assessor da Cáritas Brasileira Regional Piauí, coordenador da ASA pelo estado do Piauí e da coordenação do Fórum Piauiense de Convivência com o Semiárido.



Ilustração: Daniel Kondo


Como desmontar a Ciência e Tecnologia brasileiras

CNPq, entidade essencial ao desenvolvimento nacional, é o alvo da vez. Série de cortes brutais em Educação e Ciência escancara um Brasil q...