segunda-feira, 1 de julho de 2019

TEMPOS IDOS E VIVIDOS XI


EDUCAÇÃO HOJE, MAIS UMA VITIMA DA POLITICA  NO BRASIL

Texto incluído na obra em preparo “Reflexões, memórias e outros escritos” “.





Por Aluizio Moreira


Estamos no primeiro semestre de 2019. 
Desde janeiro deste ano, assumiu a presidência do país, o capitão do exército aposentado Jair Messias Bolsonaro.
Algumas jornais via internet postaram manchetes onde denunciaram:


“Deputada bolsonarista estimula delação de professores
Deputada incita alunos a delatar professores”
“Bolsonaro volta a ameaçar ENEM depois de estimular delação de professores”
“Deputada do PSL, com o apoio do Ministro da Educação, pede que alunos gravem vídeos para denunciar professores”


Evidentemente não eram denúncias que se estampavam nas primeiras páginas de grandes jornais como “Folha de São Paulo”, “O Globo”, “O Estado de São Paulo”. Nem tampouco ganhavam as capas das Revistas “Veja”, ou “Isto É”. São Jornais e Revistas que sobrevivem hoje na internet a partir de doações de seus leitores, daí a liberdade nas publicações. Até quando, não podemos prever.
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Não é mera coincidência, que a educação, e mais particularmente os professores, tenham sido o alvo das perseguições durante a ditadura militar iniciada em 1964. Além de criar as disciplinas obrigatórias como Organização Social e Política do Brasil (OSPB), Educação Moral e Cívica e Estudos dos Problemas Brasileiro, Diretores de Colégios e Faculdades começaram a censurar os conteúdos abordados pelos professores em sala de aula (Lembrem-se das críticas feitas por este Governo, às provas do ENEM), nos quais referências ao Imperialismo Americano, Rússia, Revolta dos Malês, 1º de maio, Dia Internacional das Mulheres, eram considerados  assuntos que “não tinham vinculação com o Programa Oficial”.


A simples referência aos nomes de autores e personalidades do mundo político e até artístico, era passível de pena. É conhecido o caso de um professor que ao debater sobre músicas do MPB, ao citar um LP de Geraldo Vandré, foi denunciado por “proselitismo político” pela Orientadora Educacional do Colégio, tendo sido sumariamente demitido. Os casos são tantos em relação à educação, aos professores e aos intelectuais em geral, que daria para editar uma obra elaborada por vários autores, com razoável número de páginas.
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Dois mil e dezenove. Nada mais, nada menos que cinquenta e cinco anos nos distanciam de Ditadura Militar iniciada em 1964. Trinta e um anos após a promulgação da chamada “Constituição cidadã” de 1988. E algumas cenas e fatos que aconteceram naquele período, renascem em minha mente como se eu vivesse novamente aqueles anos. 

É evidente que são outras circunstâncias, é outro momento histórico. Mas apenas começamos a chorar os nossos torturados, mortos e desaparecidos. Não chegamos ainda aos nossos pesadelos de “gente lá fora batendo no portão”, como denunciava Chico Buarque em “Acorda Amor” E a morte programada de Marielle pode ser identificada como a morte programada de Zuzu Angel (disponível em Globo filmes)? Quando vivenciaremos as tristes lembranças dos DOI CODI nos levando para prestar esclarecimentos, talvez numa viagem sem retorno? 

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O temor de ser denunciado por vizinhos ou alunos não era pouco. Imagino o professor, hoje chamado "doutrinador" pelos bolsonaristas, tendo que apresentar planejamento de suas aulas e as obras de referências de sua disciplina. Como aquele professor, em sala de aula onde me encontrava enquanto ainda estudante de História, ao apresentar a disciplina História do Brasil, relacionou no quadro vários autores. Crendo que estava “abafando” fiz sinal com a mão e sugeri acrescentar Leôncio Basbaum, autor pernambucano de “História Sincera da República”, bem como Nelson Werneck Sodré, autor de “Formação Histórica do Brasil”. O professor fez que não percebeu minha sugestão e insistiu em não inclui-los à lista, mesmo não havendo celular para bater foto, nem como gravar vídeos naquela época. No fim da aula, me chamou a um canto e perguntou se eu queria que ele fosse denunciado, pois Basbaum fora dirigente do Partido Comunista e Sodré era marxista. Procurou justificar-se.

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Lembro-me ainda que quando conclui meu Curso de Graduação, fui convidado para assumir umas aulas de pós-graduação (nível de especialização) em Caruaru. Disciplina: “Economia no mundo contemporâneo”. Preparei a emenda, incluindo nela o termo “Imperialismo” como forma de identificar o capitalismo a ser estudado. A coisa complicou-se quando relacionei nas Referências Bibliográficas, o nome de um cidadão Russo conhecido como Lênin, autor de “Imperialismo, etapa superior do capitalismo”. Os coordenadores pediram que modificasse tudo, pois me informaram que sabiam que existia, frequentando aquele Curso, dois estudantes que denunciavam professores, e eu poderia ir dar aula e não mais voltar. Arrisquei. Não sei se já era “loucura” dos nossos “doutrinadores”. Voltei com a missão cumprida.

Na verdade o clima era de insegurança e medo. Mais ainda quando éramos informados de professores, colegas nossos, sumariamente despedidos dos colégios e Faculdades particulares, e um convite para comparecer ao DOPS para prestar esclarecimentos.

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Para sua “salvaguarda”, as Instituições de Ensino (Fundamental ou Superior), em especial as particulares, começaram a exigir a chamada “Folha Corrida da Policia”, condição para termos um contrato de trabalho assinado pela entidade. Eu mesmo, quando fui indicado por um dos meus ex-professores para ensinar na Faculdade do Ensino Superior de Olinda, recebi do Diretor, entre os documentos exigidos como condição para ter assinado meu contrato de trabalho, a tal da “Folha Corrida”. Era meu início de carreira que terminaria antes de começar. Afinal de contas, em 1964 fazia parte do “Clube Literário Monteiro Lobato”, grupo de estudantes secundaristas de esquerda que nos reuníamos quinzenalmente para discutirmos economia, política, filosofia. Também em 1964 associei-me no Instituto Cultural Brasil-URSS, a fim de concorrer com uma bolsa de estudos para ingressar na Universidade de Amizade dos Povos Patrice Lumumba Por estas e outras fui intimado a comparecer ao DOPS para depor sobre o Clube Literário e o Instituto. Sorte minha, um colega, já advogado, companheiro de lutas em 1967/1968, no Diretório Acadêmico da UNICAP, conseguiu, não perguntei como, a tal da “Folha” sem informações comprometedoras.

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Se alguém me perguntar se estou considerando a situação política nos dias de hoje como regime de exceção, eu direi que a ditadura pode ser praticada por militares ou não-militares, com vida parlamentar ou não-parlamentar, com funcionamento ou não-funcionamento de partidos, apesar ou não da existência de um Poder Judiciário.

A distância não é muito grande quando se personaliza o poder, que beira a paranoia, que vê em tudo – ONU, Mercosul, partidos políticos, imprensa, determinados cursos, até questões e enunciados constantes de avaliações escolares – o fantasma do socialismo e do comunismo. 

O mais preocupante é quando instituições que poderiam tomar um posicionamento em defesa da democracia mesmo burguesa, cruzam os braços, por medo ou por compartilhamento. Sobretudo quando está inserido entre essas instituições o próprio Poder Judiciário.  O que permite, com boa margem de segurança, abrir as portas de vez para a ultradireita.

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