Os países onde elas governam ou estão na
vice-presidência. Quais sofreram golpes. Presença delas cresceu nos últimos 20
anos, em todos os continentes. Destaque para as líderes de Finlândia, Nova
Zelândia e Etiópia na combate à pandemia
Baixe o mapa em alta resolução aqui
Por Igor Venceslau, na coluna Outras
Cartografias
Embora
não seja nenhuma novidade, mulheres sentadas nas cadeiras de governo dos países
ainda são minoria. O que talvez seja novidade deste século é a sua ocorrência
cada vez mais frequente – e em todos os continentes. Se nos tempos de Indira
Gandhi e Isabel Perón podiam ser contatas nos dedos de uma mão, agora são
eleitas em todas as latitudes e culturas, de ocidentais a orientais, de cristãs
a muçulmanas e budistas.
Talvez
a mais influente e conhecida chefe de governo atualmente seja a chanceler alemã
Angela Merkel. No cargo desde 2006, é impossível que passe desapercebida como
única mulher nas tão divulgadas fotos da cúpula do G-7. Mas destoa também por
sua qualificação como cientista de carreira, doutorada com uma tese em química
quântica. É também do caso de Tsai Ing-wen, acadêmica de direito e presidenta
do Taiwan. O fato é que definitivamente as titulares como presidenta,
primeira-ministra ou similar não estão restritas apenas aos países
escandinavos, onde somente a Suécia não é governada por uma mulher.
Também
a eleição de mulheres não significa necessariamente governos mais
progressistas, dada a variedade dos espectros políticos que elas representam. Sua
chegada às cadeiras executivas obviamente não está isenta de contradições,
conflitos e disputas as mais variadas. Por outro lado, muitas delas foram
destaque quando o assunto é gestão da pandemia. Quem não ouviu falar na
finlandesa Sanna Marin ou na neozelandesa Jacinda Ardern nos últimos meses? Do
mesmo modo, a presidenta etíope Sahle-Work Zewde, que acumulou anos de
experiência como diretora da ONU para a União Africana, deu uma aula de
direitos humanos ao realizar a soltura de presos por conta da pandemia, uma
medida que não a isentou de controvérsias.
Igualmente
digno de atenção vem sendo o crescimento constante no número de mulheres
compondo chapas presidenciais como vice, em muitos casos eleitas. Embora a
grande imprensa tenha chamado bastante atenção para a eleição de Kamala Harris
nos EUA, num contexto marcado pelo machismo escancarado de Trump e os protestos
do Black Lives Matter, essa já era uma tendência. Aquele país
ensaiou uma presidenta em 2016 quando Hillary Clinton disputou a eleição contra
Trump.
A
vice-presidenta é um título que sacudiu as últimas eleições na América Latina,
vem sendo recorrente na África e em crescimento na Ásia. Talvez o nome que mais
soa aqui no nosso continente seja mesmo o de Cristina Kirchner, por ter sido
presidenta e também por sua liderança política. Mas são diversas as coalizões
políticas e conjunturas em vários países, todas tendo em comum a presença de
mulheres: desde a primeira vice-presidenta na Colômbia, Marta Lúcia Ramírez,
que foi ministra no governo Uribe; passando pela equatoriana María Alejandra
Muñoz, política de esquerda eleita pelo congresso como quarta pessoa a ocupar a
cadeira da vice-presidência do governo Lenín Moreno; até Epsy Barr, primeira
mulher e pessoa negra a ocupar a cadeira na Costa Rica; ou mesmo Rosario
Murillo, que é ao mesmo tempo primeira-dama e vice-presidenta da Nicarágua. Em
que medida esses são resultados da conquista efetiva de direitos ou representam
a cooptação de uma pauta pelo discurso político-eleitoral? A eleição de mulheres
deveria ser apoiada, mesmo quando seu programa de governo é conversador e
neoliberal?
A
respeito desse tema, a situação na América Latina já foi bem mais animadora. A
última década foi marcada com três das maiores economias do continente
governadas por mulheres – na Argentina de Cristina Kirchner, no Chile de
Michelle Bachelet e no Brasil de Dilma Rousseff, o que parecia concretizar uma
mudança que foi largamente combatida em todos os capítulos que já sabemos.
Agora há uma tentativa de recuperar algumas posições, dentro dos limites de uma
nova conjuntura.
O
que diferencia os três nomes anteriores é justamente aquilo está assinalado no
mapa como países que tiveram uma titular (presidenta ou primeira-ministra)
impedida de concluir o mandato de governo. Esse impedimento é traumático para
os países que sofreram, mas também para o avanço recente das mulheres nos
governos. O golpe de 2016 contra Dilma Rousseff demonstrou que esse é um
movimento muito longe de ser linear. Agora o golpe militar de fevereiro deste
ano no Mianmar, depondo a prêmio nobel e líder política Aung San Suu Kyi do
cargo de conselheira de Estado, convida novamente à inadiável imbricação das
lutas do feminismo, do anti-autoritarismo e do anti-neoliberalismo.
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