quinta-feira, 25 de julho de 2019

O destino deles e o nosso



Por Magno Francisco


Marielle Franco
                                                                                                      

A derrota das forças conservadoras, dos adoradores da ignorância, é sempre inevitável, apesar da violência, da ideologia reacionária e da perseguição.

Vejamos:

A elite ateniense prendeu e condenou o filósofo Sócrates a morte. Acusaram-no de corromper a juventude e desrespeitar os deuses, quando na verdade ele apenas ensinava, a quem encontrasse pelo caminho, a superar as aparências e alcançar a essência, a razão.

Mataram Sócrates, mas isso impediu o desenvolvimento da filosofia e da razão? Não. Pelo contrário, Sócrates dividiu a história da filosofia e não há um só lugar que não tenha ouvido falar o seu nome.

O Império Romano prendeu, torturou e assassinou Jesus na cruz. Fizeram acusações semelhantes as de Sócrates, quando o “crime” de Jesus foi defender o amor ao próximo e combater a hipocrisia. Pergunto: o cristianismo deixou de existir após a morte de Cristo? Não. É a maior religião do mundo, apesar das deturpações promovidas pelos falsos cristãos.

As monarquias e a Igreja Católica, que sabotaram o cristianismo para atender os interesses do poder feudal, perseguiram o filósofo Spinoza, que morreu na miséria. Prenderam, torturaram e queimaram em praça pública o filósofo Giordano Bruno. O motivo: eram contra as teses irracionais da Igreja.

Mas eles, Spinoza e Giordano, foram esquecidos? Jamais. A ciência provou a ligação material do universo, defendida por Spinoza, bem como os estudos indicam a infinitude do universo, defendida por Giordano.

Hitler e Mussoline queimaram os livros de filosofia, sociologia e humanidades de uma forma geral. Mataram opositores e milhões de judeus e estrangeiros, cometeram atrocidades contra os pobres. Porém, isso não impediu a derrota do nazi-fascismo.

As ditaduras militares na América Latina, inclusive no Brasil, repetiram o nazi-fascismo, mataram milhares, queimaram livros, perseguiram os que defendiam a liberdade, mas também foram derrotadas.

Onde estão os assassinos de Sócrates e Cristo, Spinoza e Giordano Bruno? Onde estão Hitler, Mussoline e os ditadores da América Latina?

Estão na lata do lixo da história, o único lugar possível para o conservadorismo, os fascistas, os inimigos da razão e adoradores da ignorância.

Todavia, Sócrates, Jesus, Spinoza, Giordano Bruno e todos e todas que lutaram contra o nazi-fascismo e as Ditaduras Militares, são heróis da humanidade, exemplos a seguir.

A glória do reconhecimento se expressa em suas vidas, moram no panteão dos grandes seres humanos, pois elevaram o patamar ético da humanidade ao defender a razão e a liberdade.

Se pudessem, os neofascistas, repetiriam o que fizeram os assassinos de Sócrates e Cristo, repetiriam a Inquisição, o nazi-fascismo e as Ditaduras Militares. Por isso perseguem a educação, perseguem a filosofia e a sociologia e matam aqueles que defendem a liberdade.

Mas a ignorância os cega. Mataram Marielle Franco, mas agora há milhares de Marielles em todo o Brasil. Do que adiantou? A luta dos negros e explorados está ainda mais forte, movida pelo sentimento de justiça por Marielle, que se tornou símbolo de razão, justiça e liberdade.

Os neofascistas, devido a burrice histórica, talvez não percebam, mas a lata do lixo da história também os espera. A presença deles no poder é o último suspiro antes da morte do capitalismo, esse sistema moribundo, promotor de miséria e desumanidade, é a última cartada possível das classes dominantes.

Eles podem perseguir a educação, a filosofia, torturar e matar os defensores da razão, os revolucionários, mas serão derrotados, pois, como ensinou Marx, não passam de farsa e tragédia.

A vitória, a glória e o futuro estão do lado dos que lutam por justiça, liberdade, razão e igualdade. Esse lado será vitorioso, pois é o lado da humanidade.



Magno Francisco, professor de filosofia, presidente da Unidade Popular-AL


FONTE:  A Verdade

sábado, 20 de julho de 2019

Como não nos indignarmos?




Por Aluizio Moreira




Se observarmos o cotidiano da mídia brasileira, constatamos uma realidade que a maioria da população desconhece.

Verificamos que há um Brasil dos que se omitem, dos que se calam, em nome da manutenção dos seus privilégios, em nome de uma pseudo neutralidade política, ou de defesa intransigente de um ou outro partido político no poder. E há um outro Brasil : uma parcela bem significativa da população de pobres, de explorados, de desempregados, de excluídos, de sem tetos, de sem terras, de sem emprego, que parecem não existir nesse país, que não têm como se manifestar.

A crise do sistema capitalista que atingiu a curva ascendente em 2007/2008 e continua ainda sabe-se lá por quanto tempo, fez surgir uma nova forma de expressão da população que tem protagonizado movimentos de rebeldia e de indignação em grande número de países da Europa e Américas. Tal movimento, embora se manifeste esporadicamente aqui e ali em nosso país, não atingiu ainda as dimensões que deveria ter atingido, dadas as situações de calamidades, de impunidade, de total omissão dos poderes públicos, jurídicos, que conscientemente adotam ações (ou omissões) a serviço de uma elite, dos grandes grupos, sejam eles nacionais ou estrangeiros.  

Diante da grande mídia monopolizadora do noticiário nacional, surgem alternativas na imprensa virtual, nos blogs, nas redes sociais, que sem copyright, sem reservas de direitos, apesar de tudo divulgam e condenam as injustiças cometidas pelos reprodutores do sistema. Para Manuel Castells, Thomas Coutrot e Stephane Hessel, essas mobilizações reforçam e apontam para a um “retorno às fontes da democracia [que] significa a intervenção do povo” (Thomas Coutrot). Como necessidade do resgate da democracia no seu significado mais autêntico, sem o falseamento ou inversão ideológica do termo pela classe política dominante hoje.

Como cruzarmos os braços diante duplo crime (contra a natureza e contra a população local) da Hidrelétrica Belo Monte? Como ficarmos indiferentes diante do massacre ocorrido contra os indígenas, da criminalização contra os trabalhadores rurais, contra a população negra, contra o LGTB, contra os sem teto? 

Como não protestarmos contra o Novo Código Florestal que segundo geógrafos e ecologistas só beneficiam o latifúndio e o agronegócio? Como não nos mobilizarmos contra a ausência de políticas públicas, sobretudo para os jovens afrodescentes no país? Como não nos indignarmos contra a violência policial que vitimam os estudantes que defendem uma educação para todos? Como não nos levantarmos contra as impunidades que acobertam assassinatos de trabalhadores, lideres camponeses, parlamentares que se posicionam contra a injustiça? 

Como não nos indignarmos contra a impunidade dos parlamentares corruptos, das negociatas quando praticam o mau uso do dinheiro público, comprando votos para apoio de partidos para aprovação de suas propostas antipopulares do governo, enquanto falta verbas para a educação, a saúde, a segurança, o sistema de transporte coletivo? 

Não adianta autoridades governamentais ou não-governamentais  declararem na midia, que reconhecem a justeza das reivindicações do nosso povo, pois as práticas políticas (e pasmem!) e até juridicas, demonstram total descaso e descompromisso com nossa população.  

Afinal, a fase de governo representativo, chegou ao seu esgotamento. A democracia burguesa que alimentamos pelo voto,  não é a democracia que queremos.

Chega a ser irônico quando a politica do Brasil "ame-o ou deixe-o" de ontem, lembra a politica do "pátria amada Brasil". de hoje.



sexta-feira, 12 de julho de 2019

Ensino superior, universidade e desenvolvimento: ensinamentos da experiência internacional



Por Reginaldo C. Moraes




No final do século XIX, o conturbado namoro da ciência acadêmica com o sistema produtivo tornou-se um casamento – e um vínculo aparentemente indissolúvel. Naquele momento acontecia o que alguns historiadores chamaram de segunda revolução industrial – alimentada pela direta aplicação do conhecimento produzido pelas universidades. A química, a física, a biologia revolucionavam a indústria, a agricultura, a logística.

Nos países líderes da manufatura avançada – Alemanha e Estados Unidos – esse processo foi marcante e, de certo modo, exemplar para o restante do mundo. O modelo alemão de universidade de pesquisa atravessou o Atlântico e inspirou a criação das primeiras instituições americanas em que essa vocação era central. Chicago, Clark e Johns Hopkins abriram a temporada. Outras nasceriam com a mesma estrela – e mesmo os antigos e clássicos colleges coloniais, como Yale, Harvard e Princeton, fariam essa passagem. Nos Estados Unidos, as universidades nucleariam uma verdadeira máquina de descoberta e inovação, competindo com a matriz germânica e, em certos momentos, alimentando-se de seus quadros, como aconteceu com a migração de cientistas e engenheiros europeus no entre-guerras e no período imediato à Segunda Guerra Mundial.

Mas a presença das universidades na decolagem do desenvolvimento econômico não se deu apenas através da pesquisa – ou da sua disseminação através de atividades de extensão. Ela também se traduziu na formação de um verdadeiro exército de profissionais de alto nível, prontos a conduzir fábricas, usinas de energia, explorações geológicas, aparatos de governo e tudo aquilo que se pode imaginar em uma sociedade complexa.

Dentro desse universo, porém, é preciso introduzir alguns reparos. Na verdade, as políticas de conhecimento adotadas por esses países-líderes iam além da criação de universidades. Se a universidade não é apenas ensino superior, mas também pesquisa e extensão, por outro lado ensino superior não se faz apenas em universidades. A massificação do ensino superior exigiria a criação de outras organizações. Algo mais teve de ser inventado – instituições diversificadas como as fachhochschulen alemãs, paralelas às universidades, as sections de technicien supérieur e institutos universitários tecnológicos na França, os community colleges nos Estados Unidos.

E em todos esses casos o setor público foi simplesmente decisivo. Mesmo nos Estados Unidos, que muita gente toma como lugar por excelência da escola privada, foi o investimento governamental que alavancou as escolas. Todas elas. No século XIX, mesmo as escolas superiores privadas receberam grandes transferências de recursos federais – como a doação de terras, que iriam explorar como um rico patrimônio. E depois obtiveram constantes injeções na forma de bolsas, empréstimos, contratação de pesquisas e assim por diante. Os especialistas calculam que mesmo nessas escolas privadas um terço do orçamento anual é coberto por recursos vindos do governo federal ou dos estaduais. A peculiaridade das escolas privadas americanas – essas que viraram quase uma lenda – é que elas não têm finalidade lucrativa, são organizadas como fundações do chamado terceiro setor.

De outro lado, esse programa do governo federal americano – a doação de terras – foi o embrião da estupenda rede de universidades e faculdades (colleges) estaduais. Em seguida vieram outros programas. Alguns deles distribuíam bolsas, como a lei dos veteranos do pós-guerra e a Lei Pell, dos anos 1960. Outros, como os programas de contratação de pesquisa, geravam infraestrutura para a invenção e a inovação – e para o treinamento de milhares de engenheiros e cientistas, muitos deles depois absorvidos por empresas. Universidades estaduais como a da Califórnia, com vários campi (Berkeley, Los Angeles, San Diego etc.) transformaram-se em gigantes das novas tecnologias. E universidades do centro-oeste, como a de Wisconsin, firmaram-se como a matriz geradora de conhecimento para a agricultura e a agroindústria, outro pilar do desenvolvimento norte-americano.

Os exemplos dos Estados Unidos e da Alemanha mostraram com toda a clareza que boas escolas – e as universidades entre elas – são uma parte decisiva da infraestrutura do desenvolvimento de um país. Tanto ou mais do que as estradas, as redes de energia ou a comunicação via satélite. Mas, assim como esses outros investimentos infraestruturais, o retorno é lento e pouco focalizado em beneficiários diretos. Por isso, dizia o especialista Richard Nelson, ficaria longe do necessário se deixado a cargo exclusivamente da decisão privada.

Outro ensinamento dessa experiência histórica é a necessidade de preservar, na investigação acadêmica, um espaço diversificado de campos e áreas de interesse. Assim, a universidade precisa, de certo modo, pairar um pouco acima do interesse imediato, da aplicação prática mais evidente – outra dificuldade para o investimento privado, muito marcado (e cada vez mais) pelo “curto-prazismo”.

Vale a pena insistir nesse ponto. Para cumprir seu papel e afirmar seu traço distintivo, a educação superior – e, dentro dela, a universidade – precisa reivindicar, obter e garantir um espaço relevante para o estudo e o ensino daquilo que é não-imediato e não-local e que, eventualmente, parece abstrato, irrelevante e até esotérico. O desafio é fazer isso sem cair na caricatura da torre de marfim e do mandarinato estéril e autocomplacente – da educação rica em informação e pobre em experiência a que se referiu um estudioso norte-americano.

Nem sempre isso é fácil de entender: o relativo distanciamento entre a universidade e aquilo que se identifica, de modo imediato e direto, como “conhecimento útil”. Assim como nem sempre é fácil conciliar o campo das “ciências duras” e aquele das ciências humanas.

Daí o papel decisivo que coube à universidade pública, na maior parte dos países desenvolvidos. Ela tem sido o espaço protegido que se permite ficar atento não apenas ao conhecimento voltado para a modificação da “natureza inerte” (ou que consideramos como tal), mas também para a gestão de nossas próprias “naturezas”, do comportamento e das relações humanas. William Arthur Lewis, um grande pioneiro das teorias do desenvolvimento, sintetizou essa ideia num ensaio de 1954:

O desenvolvimento econômico depende tanto do conhecimento tecnológico sobre coisas e criaturas vivas quanto do conhecimento social sobre o homem e as suas relações com os seus semelhantes. A primeira forma de conhecimento é frequentemente acentuada, mas a segunda tem a mesma importância. O crescimento depende tanto de saber como administrar organizações em grande escala ou de criar instituições que favoreçam o esforço para economizar, como de saber selecionar novos tipos de sementes, ou construir maiores represas. [Cito pela edição brasileira: A teoria do desenvolvimento econômico, Zahar ed., Rio de Janeiro, 1960]

Talvez ainda se invente algo que cumpra esse papel, em outros contextos, outros momentos e lugares. Mas até aqui – e aparentemente por muito tempo – ele cabe primordialmente à universidade pública.


Reginaldo Carmello Corrêa de Moraes é professor aposentado, colaborador na pós-graduação em ciência política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp. É também coordenador de Difusão do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre Estados Unidos (INCT-Ineu). Escreveu, entre outros, O peso do estado na pátria do mercado – Estados Unidos como país em desenvolvimento (2014) e Educação superior nos Estados Unidos – História e estrutura (2015), ambos pela Editora da Unesp


segunda-feira, 1 de julho de 2019

TEMPOS IDOS E VIVIDOS XI


EDUCAÇÃO HOJE, MAIS UMA VITIMA DA POLITICA  NO BRASIL

Texto incluído na obra em preparo “Reflexões, memórias e outros escritos” “.





Por Aluizio Moreira


Estamos no primeiro semestre de 2019. 
Desde janeiro deste ano, assumiu a presidência do país, o capitão do exército aposentado Jair Messias Bolsonaro.
Algumas jornais via internet postaram manchetes onde denunciaram:


“Deputada bolsonarista estimula delação de professores
Deputada incita alunos a delatar professores”
“Bolsonaro volta a ameaçar ENEM depois de estimular delação de professores”
“Deputada do PSL, com o apoio do Ministro da Educação, pede que alunos gravem vídeos para denunciar professores”


Evidentemente não eram denúncias que se estampavam nas primeiras páginas de grandes jornais como “Folha de São Paulo”, “O Globo”, “O Estado de São Paulo”. Nem tampouco ganhavam as capas das Revistas “Veja”, ou “Isto É”. São Jornais e Revistas que sobrevivem hoje na internet a partir de doações de seus leitores, daí a liberdade nas publicações. Até quando, não podemos prever.
ooOoo

Não é mera coincidência, que a educação, e mais particularmente os professores, tenham sido o alvo das perseguições durante a ditadura militar iniciada em 1964. Além de criar as disciplinas obrigatórias como Organização Social e Política do Brasil (OSPB), Educação Moral e Cívica e Estudos dos Problemas Brasileiro, Diretores de Colégios e Faculdades começaram a censurar os conteúdos abordados pelos professores em sala de aula (Lembrem-se das críticas feitas por este Governo, às provas do ENEM), nos quais referências ao Imperialismo Americano, Rússia, Revolta dos Malês, 1º de maio, Dia Internacional das Mulheres, eram considerados  assuntos que “não tinham vinculação com o Programa Oficial”.


A simples referência aos nomes de autores e personalidades do mundo político e até artístico, era passível de pena. É conhecido o caso de um professor que ao debater sobre músicas do MPB, ao citar um LP de Geraldo Vandré, foi denunciado por “proselitismo político” pela Orientadora Educacional do Colégio, tendo sido sumariamente demitido. Os casos são tantos em relação à educação, aos professores e aos intelectuais em geral, que daria para editar uma obra elaborada por vários autores, com razoável número de páginas.
ooOOoo

Dois mil e dezenove. Nada mais, nada menos que cinquenta e cinco anos nos distanciam de Ditadura Militar iniciada em 1964. Trinta e um anos após a promulgação da chamada “Constituição cidadã” de 1988. E algumas cenas e fatos que aconteceram naquele período, renascem em minha mente como se eu vivesse novamente aqueles anos. 

É evidente que são outras circunstâncias, é outro momento histórico. Mas apenas começamos a chorar os nossos torturados, mortos e desaparecidos. Não chegamos ainda aos nossos pesadelos de “gente lá fora batendo no portão”, como denunciava Chico Buarque em “Acorda Amor” E a morte programada de Marielle pode ser identificada como a morte programada de Zuzu Angel (disponível em Globo filmes)? Quando vivenciaremos as tristes lembranças dos DOI CODI nos levando para prestar esclarecimentos, talvez numa viagem sem retorno? 

ooOoo

O temor de ser denunciado por vizinhos ou alunos não era pouco. Imagino o professor, hoje chamado "doutrinador" pelos bolsonaristas, tendo que apresentar planejamento de suas aulas e as obras de referências de sua disciplina. Como aquele professor, em sala de aula onde me encontrava enquanto ainda estudante de História, ao apresentar a disciplina História do Brasil, relacionou no quadro vários autores. Crendo que estava “abafando” fiz sinal com a mão e sugeri acrescentar Leôncio Basbaum, autor pernambucano de “História Sincera da República”, bem como Nelson Werneck Sodré, autor de “Formação Histórica do Brasil”. O professor fez que não percebeu minha sugestão e insistiu em não inclui-los à lista, mesmo não havendo celular para bater foto, nem como gravar vídeos naquela época. No fim da aula, me chamou a um canto e perguntou se eu queria que ele fosse denunciado, pois Basbaum fora dirigente do Partido Comunista e Sodré era marxista. Procurou justificar-se.

ooOoo

Lembro-me ainda que quando conclui meu Curso de Graduação, fui convidado para assumir umas aulas de pós-graduação (nível de especialização) em Caruaru. Disciplina: “Economia no mundo contemporâneo”. Preparei a emenda, incluindo nela o termo “Imperialismo” como forma de identificar o capitalismo a ser estudado. A coisa complicou-se quando relacionei nas Referências Bibliográficas, o nome de um cidadão Russo conhecido como Lênin, autor de “Imperialismo, etapa superior do capitalismo”. Os coordenadores pediram que modificasse tudo, pois me informaram que sabiam que existia, frequentando aquele Curso, dois estudantes que denunciavam professores, e eu poderia ir dar aula e não mais voltar. Arrisquei. Não sei se já era “loucura” dos nossos “doutrinadores”. Voltei com a missão cumprida.

Na verdade o clima era de insegurança e medo. Mais ainda quando éramos informados de professores, colegas nossos, sumariamente despedidos dos colégios e Faculdades particulares, e um convite para comparecer ao DOPS para prestar esclarecimentos.

ooOoo

Para sua “salvaguarda”, as Instituições de Ensino (Fundamental ou Superior), em especial as particulares, começaram a exigir a chamada “Folha Corrida da Policia”, condição para termos um contrato de trabalho assinado pela entidade. Eu mesmo, quando fui indicado por um dos meus ex-professores para ensinar na Faculdade do Ensino Superior de Olinda, recebi do Diretor, entre os documentos exigidos como condição para ter assinado meu contrato de trabalho, a tal da “Folha Corrida”. Era meu início de carreira que terminaria antes de começar. Afinal de contas, em 1964 fazia parte do “Clube Literário Monteiro Lobato”, grupo de estudantes secundaristas de esquerda que nos reuníamos quinzenalmente para discutirmos economia, política, filosofia. Também em 1964 associei-me no Instituto Cultural Brasil-URSS, a fim de concorrer com uma bolsa de estudos para ingressar na Universidade de Amizade dos Povos Patrice Lumumba Por estas e outras fui intimado a comparecer ao DOPS para depor sobre o Clube Literário e o Instituto. Sorte minha, um colega, já advogado, companheiro de lutas em 1967/1968, no Diretório Acadêmico da UNICAP, conseguiu, não perguntei como, a tal da “Folha” sem informações comprometedoras.

ooOoo

Se alguém me perguntar se estou considerando a situação política nos dias de hoje como regime de exceção, eu direi que a ditadura pode ser praticada por militares ou não-militares, com vida parlamentar ou não-parlamentar, com funcionamento ou não-funcionamento de partidos, apesar ou não da existência de um Poder Judiciário.

A distância não é muito grande quando se personaliza o poder, que beira a paranoia, que vê em tudo – ONU, Mercosul, partidos políticos, imprensa, determinados cursos, até questões e enunciados constantes de avaliações escolares – o fantasma do socialismo e do comunismo. 

O mais preocupante é quando instituições que poderiam tomar um posicionamento em defesa da democracia mesmo burguesa, cruzam os braços, por medo ou por compartilhamento. Sobretudo quando está inserido entre essas instituições o próprio Poder Judiciário.  O que permite, com boa margem de segurança, abrir as portas de vez para a ultradireita.

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Como desmontar a Ciência e Tecnologia brasileiras

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